2 de julho de 1823
Dia da Independência do Brasil
- Tania Regina Pinto
Independência | Luccas Lucena – Foto: Acervo Histórico / Alesp
O que este artigo responde:
O dia da independência do Brasil não é 7 de setembro de 1822?
Quem esteve à frente da luta pela independência do Brasil?
Por que os escravizados lutaram pela independência do Brasil?
Quem é Maria Felipa?
O protagonismo é negro na libertação de Portugal.
Tudo bem a imagem do português branco sobre o cavalo, empunhando uma espada, lá no bairro do Ipiranga, na capital paulista. Por enquanto, esta é a cena! Ainda! Porque a data que importa, quando a matéria é a Independência do Brasil é 2 de julho de 1823 – 10 meses depois, na cidade de Salvador, Bahia -, quando as tropas portuguesas são finalmente expulsas do território nacional.
“A historiografia oficial fala de 7 de setembro, porque foi um movimento feito por portugueses e filhos de portugueses, que não abrangia a grande problemática do século 19, a escravização”, conta o historiador André Luís Souza de Carvalho, mestre em Educação e co-fundador do Experiência Griô, que leva visitantes para conhecer mais da história negra de Salvador.
No 7 de setembro, Dom Pedro representa o poder do homem branco, de ascendência europeia. Já o 2 de julho foi construído por pessoas pobres, negras, escravizadas, além da elite branca baiana.
“Há um processo de pensar a representação de que imagem se quer dar. A quem devemos agradecer pelo fato de ser independente”, considera o co-fundador da experiência Griô.
Mais de um ano antes
Os baianos conhecem o 2 de julho como a data da Independência do Brasil na Bahia e celebram a vitória na guerra travada por mais de 17 meses – desde fevereiro de 1822 – contra as tropas portuguesas.
Com base nos estudos de outro historiador, Luís Henrique Dias Tavares, professor emérito da Universidade Federal da Bahia, o 7 de setembro de 1822 é só uma data simbólica. Não é a real data da independência do Brasil, até porque um pedaço enorme do país – a região nordeste – ainda não estava livre dos portugueses, que haviam se recusado a sair do país após a proclamação de Dom Pedro I.
Sem contar que o sentimento de independência em relação a Portugal estava enraizado na população da Bahia desde a Revolta dos Búzios, em 1798.
“Naquela Bahia, vimos os contornos mais radicais da efetivação da Independência, com as pessoas expulsando as tropas portuguesas de seus territórios“.
O povo, mulheres
As insurreições políticas na Bahia têm a participação negra, de homens e mulheres, “participação negra e feminina silenciada no 7 de setembro”, pontua Ynaê Lopes dos Santos, professora-adjunta do Instituto de História da Universidade Federal Fluminense.
E a acadêmica destaca a importância de Maria Felipa de Oliveira. Mulher negra que trabalhava na Ilha de Itaparica com pescado e que consegue arregimentar outras mulheres negras e indígenas para lutar.
Conta o historiador Milton Moura que Maria Felipa comandou um grupo de cerca de 40 mulheres para, primeiro, seduzir os portugueses e, depois, atear fogo a 42 embarcações que, estavam aportadas na Praia do Convento, iriam atacar a capital. A ela também é atribuída uma surra de cansanção – planta tóxica que dá sensação de queimação – nos soldados.
Haiti, o estopim
Outro momento histórico importante para entender a “independência” do Brasil é o dia 2 de agosto de 1791, quando se inicia a Revolução do Haiti em São Domingos, então colônia francesa, que resulta na primeira república americana governada por pessoas de ascendência africana.
A notícia de que uma insurreição negra ocorrida no Haiti – a luta dura até 1804 – havia não somente acabado com escravidão, mas eliminado fisicamente os senhores brancos, se espalhava pelo mundo e atemorizava as elites. O Brasil era a colônia mais negra do mundo!
Muitos historiadores avaliam, inclusive, que o 7 de setembro foi mais uma articulação antinegra do que uma luta pela independência.
A Revolução do Haiti mostra o potencial de organização política da população preta. E havia, ainda, o nosso passado de luta, a memória do Quilombo dos Palmares, que cresceu nas brechas da invasão holandesa no Brasil (1624-37).
A “independência”, então, deveria ser “ordeira”, nas palavras de José Bonifácio, combinada, para que Portugal a reconhecesse. A elite do Brasil, inclusive, assume uma dívida de 2 milhões de libras esterlinas da corte com a Inglaterra.
Pelo pelourinho
Diferente das guerras de independência nas colônias espanholas que libertaram os escravos e deram origem a 18 novos Estados, a unidade territorial do Brasil como um país-continente teve que ser mantida.
Em nome da manutenção do sistema escravocrata, também, se manteve a unidade da classe dominante, territorial e o poder central. Os senhores de escravizados reprimiram o sonho de criar vários brasis, já que cada província tinha interesses econômicos específicos. Tudo para manter a chibata nas mãos.
O fortalecimento do sistema escravocrata, com a Constituição de 1824, que não acabou com o cativeiro, entretanto, ampliou a resistência dos escravizados.
No Período Regencial, de 1831 a 1840, foram inúmeras as insurreições negras e populares, como a Balaiada no Maranhão, de 1838 a 1841, e a Cabanagem no Pará, de 1835 a 1840.
A Guarda Nacional, comandada por Duque de Caxias, foi a grande responsável pelo esmagamento desses movimentos de resistência negra.
E assim é o Estado brasileiro hoje: escravista, excludente, endividado e genocida.
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