Atacante no começo dos anos 1980, desponta como revelação inglesa, e é também o primeiro jogador negro vendido – literalmente – por muito dinheiro no mercado do futebol.
O que este artigo responde: Quem é Justin Fashanu? Qual é o pioneirismo de Justin Fashanu? Como foi a infância de Justin Fashanu? Qual foi o maior desafio na carreira de Justin Fashanu? Como Justin Fashanu marreu? Qual a importância de Justin Fashanu no combate à homofobia?
Justinus Soni “Justin” Fashanu, filho dos imigrantes Patrick Fashnu, um advogado nigeriano, e de Pearl Gopal, uma enfermeira guianesa, vive 37 anos – de 19 de fevereiro de 1961 a 2 de maio de 1998. Ele nasce em Hackney e morre em Shoreditch, no Reino Unido. É um pioneiro negro que pagou, com a própria vida, por sua homossexualidade.
Abandonado por seus pais biológicos ainda na infância, em Londres, capital inglesa, Justin vive em um orfanato, com o irmão John, até os 6 anos de idade, quando ambos são adotados por um casal que morava em Norfolk.
Jovem estrela
No começo da carreira, com apenas 17 anos de idade, Justin Fashanu já figura no time principal do Norwich City, onde treina desde as categorias de base.
A estreia, como centroavante, acontece em dezembro de 1978 contra o West Bromwich Albion. Na temporada 1979/1980, consolidado na equipe profissional, é coroado como o autor do melhor gol da temporada na primeira divisão inglesa.
No documentário ‘Forbidden Games: The Justin Fashanu Story‘, da Netflix, que conta a história do atleta, John Barnes, ex-jogador do Liverpool e da seleção inglesa, define Justin em poucas palavras:
“Era um negro grande, forte, e que tinha um grande controle de bola. Ele era fenomenal do ponto de vista físico e técnico.”
Uma prova?
O atacante chegou a ser convocado para as categorias de base da seleção inglesa, passando pelo time sub-21 dos Three Lions.
Um milhão!
Em 1981, depois de marcar 40 gols em 103 jogos pelo Norwich, Justin é alvo de interesse do Nottingham Forest, uma das maiores potências do futebol inglês na época – o clube tinha acabado de vencer duas Champions League, em 1978/1979 e 1979/1980).
A transferência para o Forest chama bastante atenção – ele é vendido por um milhão de libras, valor bastante elevado em especial para um negro! Na verdade, Justin é o primeiro jogador negro a ser envolvido em uma transação por essas cifras.
Mas Justin não se “encaixa” no esquema do técnico Brian Clough, que comanda o Nottingham Forest, e acaba não apresentando o bom rendimento de quando atuava no Norwich.
Não é demais imaginar que raça, orientação sexual e tudo o mais que a braquitude odeia em nós interferiram no psicológico do atleta. E os atritos com o técnico pioraram ainda mais com os boatos de que o centroavante frequentava boates LGBT – Brian Clough chegou a proibir Justin frequentar os treinamentos.
Resumindo: sua passagem pelo Forest é encurtada com sua venda, em 1982, para o Notts County.
Mais tarde, Ambrose Mendy, que agenciava a carreira de Justin, admite:
“Sua carreira no Nottingham Forest acabou porque ele era gay.”
Jogo aberto
Com 12 anos de experiência profissional – depois de rodar por clubes como Brighton, LA Heat, Edmonton Brickmen, Manchester City e West Ham –, em 1990, Justin declara sua homossexualidade em entrevista ao The Sun, tablóide veiculado no Reino Unido e na Irlanda, tornando-se o primeiro – e até hoje, único – jogador que disputava a Primeira Divisão inglesa a fazê-lo, de acordo com o jornal The Guardian, de abril de 2012.
A manchete de capa do The Sun, edição de 22 de outubro de 1990, anuncia:
£1m Football Star: I AM GAY
(Estrela do futebol de 1 milhão de libras: Sou gay)
À época, sua entrevista não teve boa repercussão. Vários ex-companheiros de equipe reagiram, afirmando que os gays não tinham lugar em um esporte de equipe.
Seu irmão, John Fashanu – também jogador, com carreira marcada pela passagem no AFC Wimbledon – chegou a lhe oferecer 75 mil libras para que não se assumisse publicamente e o chamou de “pária” quando tudo veio a público.
Fim de carreira
A verdade mudou a vida de Justin – piadas maliciosas e ofensas passaram a fazer parte do seu cotidiano, ao mesmo tempo em que percebia sua carreira afundar.
E ele lutou, tentou se reerguer em, pelo menos, nove clubes de baixíssima expressão, incluindo o Atlanta Ruckus, um time da segunda divisão dos Estados Unidos. Mas, depois de o time fracassar nos playoffs de acesso, a direção rescindiu seu contrato.
Registre-se uma última tentativa de seguir atuando profissionalmente no Miramar Rangers, na Nova Zelândia.
Esgotado, Justin pendurou as chuteiras no final de 1997.
Desistência da vida
Em março de 1998, vivendo em Maryland, já aposentado como atacante, decidiu arricar-se como treinador de uma nova equipe que estava em processo de fundação nos EUA, o Maryland Mania, mas uma acusação de agressão sexual, feita por um jovem de 17 anos, interrompe, aos seus olhos, a possibilidade de seguir vivendo…
Segundo a denúncia, Justin se aproveitou do estado alcoolizado do jovem para manter relações sexuais.
Quando foi interrogado pela polícia americana, Justin negou ser gay. Depois, fugiu para a Inglaterra com medo da prisão.
Na época, a homossexualidade era considerada crime no estado onde vivia.
Gol contra
Um mês depois, em 3 de maio, Justin Fashanu foi encontrado enforcado em Shoreditch, perto de Londres, após ter visitado o Chariots Roman Spa, uma sauna gay.
Antes de tirar a própria vida, ele escreveu uma carta para os vivos que o julgaram:
“Me dei conta de que eu havia sido condenado. Não quero mais ser uma vergonha para meus amigos e minha família. Ser gay e uma personalidade é muito difícil, mas não posso reclamar disso”.
Sobre o caso de agressão sexual, esclarece:
“Quero dizer que não agredi sexualmente o jovem. Ele teve sexo consensual comigo, no dia seguinte, me pediu dinheiro. Quando eu recusei, ele falou ‘espere e você vai ver só’. Se esse é o caso, eu ouço vocês dizerem, por que eu fugi? Bom, a justiça nem sempre é justa. Senti que não teria um julgamento justo por conta da minha homossexualidade. Espero que Jesus me dê boas vindas e que finalmente eu encontre a paz.“
Em 9 de setembro do mesmo ano, uma investigação feita em Londres mostrou que nenhuma ordem de prisão fora expedida contra Justin Fashanu e que a polícia dos EUA havia abandonado o caso por falta de provas.
Redenção?
O compositor francês Jann Halexander, em 2013, escreveu um réquiem – missa da Igreja Católica pós-morte – para o jogador.
No ano seguinte, a banda inglesa Elephants and Castles lança seu primeiro single, intitulado “Fashanu“, em homenagem ao atacante de 1m85 de altura.
Em 2017, a Netflix lança o documentário Forbidden Games: The Justin Fashanu Story.
E Justin Fashanu segue vivo na memória dos torcedores do Norwich City e tem até um time criado em Brighton, em março de 2009, com o seu nome, o Justin Fashanu All-Stars, que busca facilitar a inclusão de homens abertamente gays dentro do futebol, com aprovação da The Football Association.
O Norwich, inclusive, tem uma torcida LGBT que costuma lembrar Justin Fashanu, os ‘Proud Canaries’ – Canários Orgulhosos, em tradução livre, uma referência ao animal que está no escudo do clube.
Fontes: Wikipédia, Folha S. Paulo, TNT Sports