Considerada também a maior poetisa mística do Brasil, ultrarromântica, escrevia, com alguma influência simbolista, uma produção de alto valor estético.
O que este artigo responde: Quem foi Auta de Souza? Qual é a obra mais conhecida de Auta de Souza? Quais temas Auta de Souza explorou em sua poesia? Como Auta de Souza é reconhecida na literatura brasileira? Qual foi o impacto da vida pessoal de Auta de Souza em sua obra?
Auta de Souza vive 25 anos, de 1876 a 1901 – nasce em Macaíba, Rio Grande do Norte, em 12 de setembro e morre em 7 de fevereiro. Poetisa de segunda geração romântica, é autora de Horto, de 1900, que a tornou a primeira poeta negra da literatura brasileira, ombreando em pioneirismo com a romancista maranhense Maria Firmina.
Prefaciado por Olavo Bilac – poeta mais célebre da época, elogiado pela crítica e lido com avidez tanto por intelectuais como pelo povo da época, Horto – o único livro de Auta de Souza – retrata os cinco fatos mais marcantes da curta vida de Auta de Souza: uma frustração amorosa, a religiosidade, a orfandade, uma tragédia – a morte de seu irmão caçula – e uma doença chamada tuberculose.
A presença da morte
Filha de Elói Castriciano de Souza e Henriqueta Leopoldina Rodrigues, Auta de Souza fica órfã de mãe aos três anos idade e de pai, aos 4. Os dois morreram de tuberculose – ela, com 27 anos, e ele, aos 38 anos.
Aos doze anos, seu irmão mais novo, Irineu Leão Rodrigues de Sousa, sofre morte acidental, causada pela explosão de um candeeiro.
Aos catorze anos é ela quem recebe o diagnóstico tuberculose, tem que interromper seus estudos no colégio religioso e dá prosseguimento à sua formação intelectual como autodidata.
Não demora, aos dezenove anos, se apaixona por João Leopoldo da Silva Loureiro, promotor público de sua cidade natal, com quem namora durante um ano e de quem é obrigada a se separar. Isso porque seus irmãos – os políticos norte-rio-grandenses Elói de Sousa e Henrique Castriciano – se preocupam com o seu estado de saúde.
Pouco depois da separação, ele também morre vítima da tuberculose. E, assim, a poetisa encerra seu primeiro livro de manuscritos, intitulado Dhálias, que mais tarde seria publicado sob o título de Horto.
A criação
Sua avó materna, Silvina Maria da Conceição de Paula Rodrigues, assumiu os cuidados com a poetisa desde a infância. Conhecida como Dindinha, levou a menina para uma chácara em Recife, capital de Pernambuco, onde foi alfabetizada por professores particulares.
Aos onze anos, Auta foi matriculada no Colégio São Vicente de Paula, dirigido por freiras vicentinas francesas, Lá, ela aprendeu Francês, Inglês, Literatura – em especial literatura religiosa -, Música e Desenho.
E, ainda, versejava em português e francês; lia no original as obras de Victor Hugo, Lamartine, Chateaubriand e Fénelon, e colaborava na melhor imprensa do seu estado antes de completar 20 anos.
Quando teve de se afastar do colégio, devido a tuberculose, continuou participando da União Pia das Filhas de Maria, à qual se uniu na escola. Foi professora de catecismo em Macaíba e escreveu versos religiosos.
A escritora
Auta começa a escrever aos dezesseis anos, apesar da doença. Frequenta o Club do Biscoito, associação de amigos que promovia reuniões dançantes onde os convidados recitavam poemas de vários autores, como Casimiro de Abreu, Gonçalves Dias, Castro Alves, Junqueira Freire e os potiguares Lourival Açucena, Areias Bajão e Segundo Wanderley.
Da segunda geração romântica – chamada “ultrarromântica”, “byroniana” ou o “Mal do Século”, ela escrevia poemas românticos com alguma influência simbolista. Segundo o historiador Luís da Câmara Cascudo, que se dedicou ao estudo da cultura brasileira, Auta de Souza é “a maior poetisa mística do Brasil”.
O advogado Jackson Figueiredo, organizador do Movimento Católico Leigo, a considera uma das mais altas expressões da poesia católica nas letras femininas brasileiras.
Aos dezoito anos, Auta colabora com a revista Oásis, e aos vinte escreve para os jornais A Tribuna e A República, de maior circulação e que lhe deu visibilidade para a imprensa de outras regiões.
Seus poemas estão publicados no jornal O Paiz, do Rio de Janeiro e seus versos dividem espaço, ao lado de vários escritores famosos do Nordeste. Entre 1899 e 1900, assina seus poemas com os pseudônimos de Ida Salúcio e Hilário das Neves, prática comum à época.
Os jornais A Gazetinha, de Recife, e no jornal religioso Oito de Setembro, de Natal, também abrem espaço para a sua literatura. Mas é na Revista do Rio Grande do Norte que ela conquista outro pioneirismo como a única mulher entre os colaboradores.
Auta de Souza vence a resistência dos círculos literários e escreve profissionalmente em uma sociedade em que este ofício era quase que exclusividade dos homens, já que a crítica ignorava as mulheres escritoras.
Sua poesia circula nas rodas literárias de todo o país e a torna, também, a poetisa norte-rio-grandense mais conhecida fora do estado.
Homenagens póstumas
Quando morre, Auta é sepultada no cemitério do Alecrim, em Natal, capital do Rio Grande do Norte. Mas três anos depois, em 1904, seus restos mortais são transportados para o jazigo da família, na parede da Igreja de Nossa Senhora da Conceição, em Macaíba, sua cidade natal.
Em 1936, a Academia Norte-Riograndense de Letras dedicou-lhe a poltrona 20, como reconhecimento à sua obra.
Em 1951, uma lápide é construída, tendo como epitáfio versos extraídos de seu poema Ao Pé do Túmulo:
“Longe da mágoa, enfim no céu repousa
Quem sofreu muito e quem amou demais.”
Em 12 de setembro de 2008, durante as comemorações do nascimento da poetisa em sua cidade natal, é lançado o documentário “Noite Auta, Céu Risonho”, escrito e dirigido por Ana Laudelina Ferreira Gomes, professora e pesquisadora da Universidade Federal do Rio Grande do Norte e produzido pela TV Universitária, em parceria com o Núcleo Câmara Cascudo de Estudos Norte-Riograndenses.
Catorze de seus poemas foram musicados por artistas regionais, mas apenas dois de deles têm registros fonográficos – Rezando e Caminho do Sertão. Os demais foram transmitidos apenas pela tradição oral, em modinhas cantadas na escola e em festividades.
O poeta paulistano Mário de Andrade, em sua obra Um Turista Aprendiz, cita esses poemas musicados, que ouvira em sua viagem a Natal, na década de 1920.