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InícioCorpos negros periféricos e o Prêmio APCA de Naruna Costa

Corpos negros periféricos e o Prêmio APCA de Naruna Costa

Foram precisos 61 anos para que a Associação Paulista de Críticos de Artes reconhecesse, pela primeira vez, um trabalho fora dos padrões convencionais do teatro brasileiro, com o troféu de Melhor Direção.

Naruna Costa foto de topo
Naruna Costa. Foto: Bob Wolfenson/Netflix/Divulgação.

A atriz, cantora, compositora, roteirista e diretora de arte, Naruna Costa é a primeira mulher negra a ganhar o Prêmio APCA 2018, de Melhor Direção Teatral, à frente do espetáculo Buraquinhos ou o Vento é Inimigo do Picumã, escrito por Jhonny Salaberg.

Um ano antes, quando a Associação Paulista de Críticos de Artes premiou, pela primeira vez, uma mulher branca, pela melhor direção – Bia Lessa, por Grande Sertão: Veredas -, Naruna foi indicada ao Prêmio APCA na categoria Melhor Atriz 2017 pelo espetáculo Antígona, realizado no Teatro Ágora.

Em entrevista ao site UOL, na semana da premiação, Naruna ressaltou a importância desse reconhecimento fora dos padrões convencionais do teatro no Brasil:

“É super importante esse prêmio no sentido de reconhecer um trabalho fora dos padrões convencionais do teatro no Brasil, que nasce de corpos negros periféricos dirigido por uma mulher, ele vai na contramão do que a gente tem com maior visibilidade no teatro”.

Há de se reconhecer que, por ser tardio, apesar do lado positivo, esse reconhecimento revela o racismo e o machismo estrutural dentro de um prêmio tão tradicional.

Espaço negro

Naruna fala sobre a ausência de mulheres negras no audiovisual, questiona quais são os papéis que cabem a atrizes como ela, e divide um sonho: fazer mais papéis que não estejam associados à cor da pele.

Nos seus 15 anos de experiência em TV e teatro, Naruna interpretou a cantora Elza Soares na montagem Garrincha, do diretor norte-americano Robert Wilson, no Sesc Pinheiros, em São Paulo no ano de 2016, e Angela Davis.

Naruna Costa como Angela Davis
Naruna Costa caracterizada como Angela Davis para o programa “Falas Negras”, exibido pela TV Globo, 2020. Foto: Divulgação.

Seu trabalho de maior visibilidade e também a personagem mais profunda de sua carreira, é Cristina, de Irmandade, série brasileira da Netflix. Na série, de 2019, ela é uma advogada que trabalha no Ministério Público e é coagida pela polícia a se tornar informante dentro de um grupo criminoso liderado por seu irmão, papel de Seu Jorge.

“Ela transita pela ideia de ser uma pessoa boa ou má, ética ou não ética. O que define a Cristina são os dilemas, isso é apaixonante, poucas personagens negras têm essa profundidade no Brasil.”

No cinema nacional, destaque para atuação nos filmes Hoje eu Quero Voltar Sozinho, Causa e Efeito, Toro, Mundo Deserto de Almas Negras, Amor em Sampa e Marighella.

Corpos periféricos

Nascida e criada no bairro Freitas Júnior, periferia de Taboão da Serra, em 24 de fevereiro de 1983, Naruna, deu os primeiros passos na carreira por meio da União Teatral Taboão (UTT), criada em 1997 e dirigida por Amaury Alvarez, onde atuou em peças como A Torre em Concurso.

Em 2002, com outros artistas, cria o Grupo Clariô de Teatro, referência da militância negra de cultura periférica de São Paulo e, em 2005, inaugura o Espaço Clariô, da qual é co-fundadora.

Naruna Costa em teatro
Naruna Costa na peça de teatro “Urubu Come Carniça e Voa!”. Foto: Guma.

O local é utilizado para ensaios e apresentações do grupo e para realização de projetos culturais continuados, abertos à comunidade.

Com o grupo, Naruna estrelou a peça Hospital da Gente, de Marcelino Freire, em 2008, que ficou três anos em cartaz e retornou em 2018; Urubu Come Carniça e Voa! , de Mirto da Muribeca, quatro anos em cartaz, e Severina – Da Morte à Vida, em que Naruna também assina a direção, de 2015.

TV e Música

Na TV, Naruna se destaca no seriado Força Tarefa, da Rede Globo; na novela Dance, Dance, Dance da TV Bandeirantes, e como apresentadora dos programa Festival de Vídeo Tela Digital da TV Brasil.

Em 2018, ela integra o elenco da série Rotas do Ódio da Universal Channel e, em 2020, a série da Rede Globo, Todas as Mulheres do Mundo.

Naruna é cantora tocadeira e compositora do grupo de pesquisa de musica urbana de raiz popular chamado Clarianas, junto com Martinha Soares e Naloana Lima.

Elas lançaram seu primeiro disco Girandêra, em 2012, e o CD, Quebra Quebranto, em 2019: “É um disco para evocar proteção e cura, com canções que convocam, ao mesmo tempo, um chamado para reflexões sobre temas sociais urgentes, e acalanto, esperança e fé na beleza das cantorias populares”, afirmam as Clarianas.

O grupo inspira-se em repertório de tradição popular e da periferia e em cantos caboclos de matriz africana, nordestina e indígena.

Grupo Clarianas
Clarianas lançam seu segundo CD “Quebra Quebranto”, no Sesc Pompeia. Foto: Divulgação

Em 2017, as Clarianas participaram como backing vocal  de 5 faixas do CD Espiral de Ilusão do cantor Criolo.

Naruna é formada pela Escola de Arte Dramática da Universidade de São Paulo, desde 2008, ano em que marca o início da conquista de vários prêmios pessoais e junto com o Grupo Clariô.

Naruna Costa é viúva de Mário Pazini Jr., que dirigiu a cena Da Paz no espetáculo Hospital da Gente, do Grupo Clariô.

Conheça a história de pioneirismo das atrizes Lupita Nyong’o, Ruth de Souza, Lena Horne e Viola Davis.

Fontes:

Geledés

Primeira mulher negra a ganhar o APCA de direção: Vergonhoso – Carta Capital

Verbete da Wikipédia sobre Naruna Costa

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