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InícioLuciana Camargo e Rodrigo Cabral, primeiro casal negro a apresentar um telejornal

Luciana Camargo e Rodrigo Cabral, primeiro casal negro a apresentar um telejornal

Com mais de 20 anos de profissão, os jornalistas protagonizaram um momento histórico na TV brasileira ao dividirem a bancada do principal jornal da emissora, o “Rede TV News”, na noite de sábado, 4 de agosto de 2018. 

Luciana Camargo e Rodrigo Cabral compõem, na RedeTV!, a primeira bancada negra na televisão brasileira. (Imagem: Reprodução)
Luciana Camargo e Rodrigo Cabral compõem, na RedeTV!, a primeira bancada negra na televisão brasileira. (Imagem: Reprodução)

Os dois jornalistas surpreenderam-se com a “oportunidade” de representar mais da metade da população brasileira! – 54,9% se autodeclara preta ou parda, segundo o IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. 

“Eu vi a escala e pensei: ‘Eu com o Rodrigo?’. E liguei para a minha mãe: ‘Você sabe a importância disso?’. Ela disse: ‘Eu sei, filha, já estava na hora de acontecer’. Soube ter resiliência e paciência… E que bom que estamos à altura dessa população que tem tão pouca representatividade não só na TV, mas em tudo”, celebrou Luciana na ocasião. 

Anos atrás, negros e negras não ocupavam bancadas de telejornais. era comum ver isso em uma bancada de telejornal de forma alguma. “Durante muito tempo – como lembra Rodrigo -, a televisão teve o padrão do branco, boa pinta, ou da apresentadora loira. Essa barreira vem sendo quebrada aos pouquinhos. Representamos um divisor de águas”, comemora. 

A escalação dos dois jornalistas negros para comandar o RedeTV News não foi intencional, tanto que aconteceu em um dia comum e não em datas consideradas representativas para os negros, como 13 de maio – quando foi assinada a falsa lei da abolição da escravatura – ou 20 de novembro – dia do assassinato de Zumbi dos Palmares, em 1595, e Dia Nacional da Consciência Negra.

Os jornalistas já se revezavam na bancada do telejornal aos fins de semana, mas Luciana e Rodrigo nunca haviam dividido a apresentação

“Foi uma coincidência. Vi a escalação e pensei: ‘Tem que ser e vamos incentivar para que isso ocorra mais vezes’. São dois excelentes profissionais que merecem muito mais espaço. Estou feliz pela oportunidade, uma concessão pública de TV tem que fazer isso mesmo. Por outro lado, é triste que tenha demorado tanto para que houvesse uma bancada negra no Brasil”, afirma Franz Vacek, superintendente de jornalismo e esporte da RedeTV!.

Taquicardia e euforia vazada

Apesar da escalação casual, o clima nos bastidores foi de emoção e nervosismo antes e depois do telejornal. Luciana admite que sentiu no coração o peso da representatividade

“Confesso que fazia tempo que não tinha taquicardia antes de uma apresentação. Eu fiquei ansiosa, aquela coisa de quão responsável era esse momento, e o corpo respondeu. Só acreditei mesmo quando de fato aconteceu”.

No encerramento do telejornal, a jornalista leu, com o colega, o agradecimento que escreveu:

“Pela primeira vez em nosso país, uma emissora de TV dá oportunidade a dois jornalistas negros de apresentarem juntos o principal telejornal da casa. Nós agradecemos à diretoria da RedeTV! por essa oportunidade”.

O que não estava no texto foi a euforia dos dois vazada no ar, como revelou Rodrigo Cabral:

“Assim que falou o ‘boa noite’ e começaram a subir os créditos, nos demos as mãos em um gesto de comemoração e ela disse: ‘Conseguimos!’. E eu falei: ‘Maravilha!’. E aí avisaram no ponto eletrônico: ‘Acho que vazou’. Percebi que os olhos dela estavam marejados. Foi um momento de muita emoção”.

Rodrigo Cabral (Imagem: RedeTV!)

Rodrigo é um dos funcionários mais antigos da casa e contou, comovido, a festa realizada por toda a equipe fora do ar: 

“Todo mundo veio confraternizar com a gente logo depois que acabou o jornal: câmeras, pessoal de retaguarda, de bastidores. Fizemos uma roda no meio da redação. Nos abraçamos. Foi realmente um momento inesquecível”.

Vitória contra o racismo

“Você tem 24 horas para conversar?”, brinca Luciana Camargo ao ser perguntada sobre os casos de racismo que sofreu na carreira. Uma bancada negra também significou uma vitória pessoal para ela e para Cabral. “Já passei por muita coisa ruim, mas só serviu para me fortalecer. Criei uma casquinha bem grossa”, desabafa. 

Rodrigo tem na memória o último episódio racista do qual foi vítima quando trabalhava como repórter esportivo: “O time tinha perdido e, saindo do estádio, eu ouvi um torcedor gritar ‘macaco’. Na hora, eu ignorei”.

(É, o mineiro de Belo Horizonte Rodrigo Cabral já atuou também como repórter e narrador esportivo. Formado, desde 1996, pelo Universidade Federal de Minas Gerais, iniciou sua carreira no Canal 15, extinta TV a cabo de Belo Horizonte.)

Luciana Camargo (Imagem: RedeTV!)

Para a apresentadora, aquele foi um novo momento. 

“Sempre foram dois brancos na bancada. Depois, um branco e um negro. Estamos mudando isso, vamos pôr a cara do Brasil no vídeo. Essa data, para mim, marca um redescobrimento profissional”.

 Vale saber que a jornalista de São Paulo, Luciana Camargo, 48 anos, já atuou na maioria dos grandes canais da televisão aberta brasileira, como TV Cultura, Gazeta e Rede Globo e foi indicada duas vezes para receber o Troféu Raça Negra na categoria como «melhor jornalista feminino». Ela se formou na Universidade Metodista. 

Globo fica atrás

Depois da Rede TVNews! A Globo correu e colocou Maju Coutinho e Heraldo Pereira para apresentarem o Jornal Nacional em uma noite de sábado. Mas, neste espaço da televisão brasileira, seu pioneirismo fica por conta da estreia da jornalista na bancada do JN em 16 de fevereiro de 2019, isso às vésperas do telejornal completar 50 anos no ar!

A primeira edição do JN foi em 1º de setembro de 1969. Triste detalhe: o telejornal nunca teve âncoras negros fixos. No começo os apresentadores eram Cid Moreira e Hilton Gomes. A primeira mulher a sentar à bancada foi Márcia Mendes, em uma homenagem ao Dia Internacional da Mulher, em 8 de março de 1972.

A primeira âncora foi Valéria Monteiro, que assumiu o cargo em 1992. Só a partir de 1996, o jornal colocou um casal como âncoras. O primeiro homem negro a apresentar o ‘JN’ foi Heraldo Pereira, que se sentou à bancada há 17 anos, em 2002. E, em 2019, Maju Coutinho.

Ainda muito a conquistar!


Fontes: Uol, Gazeta e Wikipedia (Jornal Nacional, Luciana Camargo, Rodrigo Cabral).

Escrito em 23 de maio de 2019

2 comentários em “Luciana Camargo e Rodrigo Cabral, primeiro casal negro a apresentar um telejornal”

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