Jeremias e Milena: os primeiros negros da ‘Turma da Mônica’

O universo dos quadrinhos de Maurício de Sousa levou quase seis décadas para enxergar e/ou incluir uma menina negra em suas histórias. Antes dela, teve um menino, o Jeremias, criado em 1960.

Mônica, Cebolinha, Cascão, Magali e, finalmente, Milena.

Essa é uma história que começa em 1959, com Bidu e Franjinha e a Turma do Bermudão, que incluía o Jeremias. Mas, não demora, surgem Mônica e Cebolinha, entre 1960  e 1963, que roubam a cena e assumem os papéis de protagonistas. No coração deles, o cartunista Maurício de Souza que os leva para mais de 40 países do mundo em forma de gibis, livros, brinquedos, discos, CD-roms, jogos eletrônicos… 

Assim, a Turma da Mônica conta quem somos em 14 idiomas, através de seus personagens de personalidade marcante, só que omitindo a existência de 56% da população brasileira, negra. Quer dizer, existia o  Pelé. Ou melhor, o Jeremias, inspirado no Rei do Futebol.

Nossas crianças – em especial as meninas – só puderam se enxergar na Turma da Mônica em 2017, com a chegada da Milena, a primeira protagonista feminina negra dos quadrinhos do cartunista. 

Sem edição oficial

Ao contrário dos outros personagens, Milena não tem sua turma e uma série de quadrinhos com seu nome. Para ela, nada de estreia oficial nos gibis.  Apresentada ao público no dia 17 de dezembro de 2017, no evento “Corrida Donas da Rua”, no Parque do Ibirapuera, na capital paulista, Milena aparece como ativista mirim na defesa do empoderamento feminino e da igualdade de gênero.

“Donas da Rua” é uma iniciativa da Maurício de Sousa Produções para encorajar meninas de todos os tipos e lugares a se tornarem suas próprias heroínas e a estreia diferenciada foi pensada para que todas as características da personagem fossem mais nítidas do que nos quadrinhos, inclusive para que todos pudessem ver de perto a sua personalidade.

Em 2019, na edição “A Nova Amiguinha”, Milena passa a morar no Bairro do Limoeiro, onde vivem os personagens da Turma da Mônica. 

A primeira família

Com 7 anos, Milena é também defensora dos animais e apaixonada por futebol. Seu aniversário, 25 de junho, é o dia em que se celebra, desde 1975, a independência de Moçambique, no sudeste da África – mas esta é apenas uma curiosidade.

Silvia, médica veterinária, dona da clínica veterinária do Bairro do Limoeiro, e  Renato, publicitário, são seus pais; Fabinho e Sol, seus irmãos. Juntos, eles formam a Família Sustenido, porque todos têm apelidos que se referem a notas musicais: Mi,de Milena;  Si, de Silvia; Re, de Renato,  Fa, de Fabinho,  e Sol, de Sol mesmo.

Representatividade importa

A Turma da Mônica não foi pensada só para o público infantil, mas para pessoas de todas as idades que, com a chegada, mesmo tardia, da ativista mirim Milena tem ampliado o espaço para o debate de temas atuais da sociedade.

A Maurício de Sousa Produções se atualiza e engrossa a fileira das ações educativas, via quadrinhos, para questões como consciência racial e social, valores éticos e estéticos, diversidade no existir. 

Destaque-se, neste processo, a presença do Movimento Negro que se propôs a conversar com Mônica Sousa, diretora-executiva da Maurício de Sousa Produções, de debates e rodas de conversa para discutir a importância da personagem Milena e de seus saberes ancestrais.

Além dos quadrinhos

Milena é inspiração para a coleção “Donas da Rua”, criada pela produtora Lab Fantasma. A empresa do rapper e escritor Emicida decidiu abordar a importância da representatividade para o universo feminino por meio da mais nova integrante da Turma da Mônica. 

“Bastante inspirados por essa pegada urbana e de empoderamento, desenvolvemos a coleção Milena Donas da Rua. Com foco no público jovem-adulto, as peças oferecem praticidade, conforto e estilo, demonstrando por meio das estampas toda a autoestima, confiança e otimismo, que são características da Milena” – anuncia o site da Lab.

O “Pelé” da Turma

Jeremias é o Pelé da Turma da Mônica, criado em 1960, chega ao mundo com 10 anos idade, nariz redondo, alto, roupas casualmente cinzas, short branco, boné vermelho e sapatos verde-água -no começo eram azuis.

Perspicaz, divertido, simpático, sagaz, leal e engraçado, Jeremias tem fome de aprender, é todo estiloso, e foi criado junto com seus parceiros de chuteiras: Manezinho, Titi e Franjinha, a “Turma do Bermudão”.

No começo, o personagem era bem estereotipado, quase uma caricatura, com suas características físicas retratadas de forma exagerada. Mas, ao longo dos anos, foi sendo “humanizado” a ponto de ganhar uma história quase 50 anos depois de nascido – permitam-se um pouco de ironia.

Em 2009, ele ganha uma história solo, produzida pelo quadrinista  André Diniz. Depois, em abril de 2018, a 18ª Graphic Novel, o “inclui” na sociedade brasileira, abordando questões raciais, com prefácio de Emicida e tudo. Até que, em 2019, em mais uma história de um personagem negro da Turma da Mônica escrita por Rafael Calça, para uma revista mensal, surge a personagem Milena, a primeira menina negra protagonista da Turma da Mônica, que havia “estreado” no Parque do Ibirapuera, em 2017, sem tirinhas nem nada.

Da “biografia” de Jeremias consta que ele é filho de um casal de arquitetos. Seu tataravô era Jeremim, um príncipe africano que foi escravizado e, no Brasil, lutou por liberdade.

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Conheça também a história do primeiro Superman negro dos quadrinhos.

Fontes: Maurício de Sousa Produções, Omelete, Site B9, Olhar Digital, Mônica Fandom, UOL Geek, Hypeness, Universidade Federal de Minas Gerais, Lab Fantasma, Turma da Monica Fandom, Wikipédia

Este texto foi escrito em setembro de 2021 e atualizado em agosto de 2024.