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Valerie Thomas: da ilusão à realidade 3D

De menina curiosa a física e inventora, a cientista criou o primeiro aparelho transmissor de ilusão da história

Valerie Thomas (Imagem: Nasa)

Toda repressão, todo machismo, todo ódio pelo feminino foram impotentes na contenção da criatividade científica das mulheres negras que, com suas ideias mirabolantes, ao longo da história, mudaram – e seguem transformando – o mundo em que vivemos. 

Valerie LaVerne Thomas é uma dessas mulheres. Afro-americana, ela é conhecida pela invenção do aparelho transmissor de ilusão – um dispositivo capaz de criar, transmitir e receber imagens 3D de um objeto em tempo real. Isso em 1978!

Atualmente, sua patente é usada em salas cirúrgicas, no desenvolvimento de telas de televisão e na agência espacial americana, a NASA -National Aeronautics and Space Administration.

“Quando eu era jovem, as TVs eram muito diferentes. A que tínhamos em casa, se parecia como uma caixa grande, cheia de tubos, que eram como lâmpadas. E quando os tubos explodiram, a TV não funcionou mais! Mas meu pai abriu a caixa para manutenção e eu pude ver aquelas peças e pensei: Como a integração desses dispositivos pode resultar em uma imagem na tela? Nunca perguntei ao meu pai, mas fiquei curiosa sobre isso desde então”, lembrou Valerie Thomas, em entrevista à revista digital Oprah Daily, publicada em julho de 2021.

Por que?…

Curiosa desde criança, Valerie Thomas sempre perguntava como as coisas funcionavam e por que funcionavam daquela forma. Desde os 8 anos de idade, se interessava por ciência e engenharia eletrônica. Mas ela só se ‘encontrou’ com a Física e a Matemática ao ingressar no ensino superior na década de 1960

Em um dia comum do ano de 1976, já com o diploma de física da Morgan State University, de Maryland, Estados Unidos, e trabalhando para a NASA, Valerie estava em um seminário científico e, durante o intervalo, passeando pela exposição, se deparou com um trabalho curioso que chamou sua atenção: tratava-se de uma ilusão de ótica.

O projeto que tanto a intrigou apresentava uma lâmpada incandescente que permanecia acesa mesmo após ser desenroscada da boquilha. Ela analisou o experimento e, conversando com o projetista, descobriu que a experiência era feita com o uso de espelhos côncavos.

O cientista explicou como a “mágica” acontecia: em uma mesa plana, ele colocou um soquete de luz abaixo do soquete regular e enroscou a lâmpada. Em seguida, posicionou um espelho côncavo atrás dos objeto – nesse tipo de espelho a imagem é invertida em relação ao objeto real -, assim a lâmpada de verdade, que estava virada para baixo, foi refletida virada para cima, parecendo real.

Para entender melhor assista esse vídeo: https://youtu.be/hKmCJ8JElfU

Cérebro, paixão e coragem

Fascinada – como se tivesse um ‘soquete’ dentro da cabeça -, viu refletir-se uma nova ‘luz’ – desta vez, símbolo de grandes ideias. 

Valerie Thomas (Imagem: Svart historia)

A física começa a pensar possíveis aplicações do experimento com o uso de espelhos côncavos em um projeto que estava desenvolvendo para a NASA. Seu desafio era descobrir como converter dados enviados de um satélite em imagens tridimensionais e tornar o estudo do espaço mais preciso.

Em outras palavras: ela tinha que inventar um dispositivo capaz de transmitir uma imagem 3D de um objeto espacial para a Terra em tempo real.

A experiência

Em 1977, ela inicia seus experimentos com ilusões usando espelho côncavo e parabólico e observa:

No espelho côncavo, quando um objeto é colocado na frente, o olho humano combina os dois reflexos criados em uma única imagem 3D, bem na frente do vidro. Além disso, o tamanho e a posição do espelho afeta diretamente como a ilusão é apresentada, ou seja pode ser distorcida ou não.

Já o espelho parabólico, devido ao seu formato curvado, garante que a imagem apresentada em qualquer ponto no espelho esteja alinhada ao ponto focal. Quer dizer, a forma parabólica minimiza as distorções da imagem.

Mesclando os dois espelhos, ela percebe que é possível criar ilusões ópticas e seus esforços culminam na invenção do Illusion Transmitter (aparelho transmissor de ilusão).

Como funciona?

No local de transmissão, um espelho parabólico côncavo é usado ​​para criar uma imagem 3D, independente do tipo de objeto. Posteriormente, um sistema de detecção de imagem converte a imagem tridimensional em sinais de vídeo e os envia para um receptor que, por sua vez, passa para um projetor que exibe a imagem em outro espelho parabólico, criando a ilusão em tempo real.

Illusion Transmitter (Imagem: Reprodução)

Valerie solicita a patente do aparelho em 28 de dezembro de 1978, mas ela só é emitida no ano de 1980.

Inventar o 3D, entretanto, pode-se dizer, foi apenas um dos muitos desafios de ser Valerie Thomas, uma mulher, nascida negra, e com desejos de viver profissionalmente em um mundo que, na origem, não foi criado se quer para compartilhar o banheiro – ou mesmo o café de uma garrafa térmica – com ela.

Valerie Thomas (Imagem: Svart historia)

Valerie nasceu nos Estados Unidos da América da segregação racial ostensiva.

Carreira com “C” maiúsculo

Quando ingressa na NASA em 1964, como analista de dados, Valerie Thomas nunca havia visto um computador, exceto por meio de filmes de ficção científica, mas teve que aprender rápido como funcionava a máquina, já que uma de suas funções era criar programas de computador. 

Sua formação ajudou. Ela entendia álgebra abstrata e diferentes sistemas numéricos necessários para a programação.

Nos seis primeiros anos, ela trabalhou no desenvolvimento de sistemas de dados de computador em tempo real para apoiar a criação dos satélites Orbiting Geophysical Observatory (OGO) – equipamentos que estudam as interações magnéticas entre a Terra e o Sol.

Em 1970, foi designada para supervisionar a criação do programa Landsat – primeiro satélite da NASA capaz de tirar fotos da Terra. Sua tarefa era desenvolver um programa capaz de traduzir e mapear os dados brutos e complexos do equipamento em padrões simples para que os cientistas pudessem tanto usá-los como estudá-los..

Landsat (Imagem: Nasa)

Ela se tornou especialista internacional em produtos de dados Landsat.

Cinco anos depois, Valerie Thomas chefiou uma equipe com cerca de 50 pessoas para a expansão do Experimento de Inventário de Culturas de Grandes Áreas (LACIE), um projeto científico capaz de automatizar o processo de previsão da produtividade do trigo em nível mundial, por meio de tecnologia espacial.

Na década de 1980, nossa pioneira é gerente de instalações de computadores da National Space Science Data Center (NSSDC) e do projeto da Rede de Análise de Física Espacial (SPAN).

Antes de se aposentar em 1995, a física criou um programa de computador que permitiu aos cientistas estudar o cometa Halley, a camada de ozônio, satélites e ainda apoiar a criação da espaçonave Voyager, ainda em estudo, com sondas interestelares robóticas..

“Nóis por nóis”

Esta expressão, muito usada no Brasil afrodescendente, conta muito de seus sonhos de infância e do incentivo que recebeu para não realizá-los. 

Ela é modelo, referência, para jovens engenheiros e cientistas negros e negras. Sua história está em livros de ficção científica, de ciência, na televisão, em videogames… Mesmo aposentada, se reúne com alunos e alunas, participa de exposições e feiras científicas para orientar estudantes, sem distinção de sexo ou orientação sexual. Ela faz o que não teve. 

Valerie Thomas (Imagem: Sahar Coston)

Nascida em 8 de fevereiro de 1943, no estado de Maryland, nos Estados Unidos, despertou para a engenharia eletrônica porque seu pai gostava de trabalhar com mecânica. E embora a deixasse vê-lo trabalhando, não respondia à maioria das suas indagações. Ele também acreditava que a ciência era reserva de mercado dos meninos.

Sua educação foi moldada em uma escola só para meninas, orientada a se concentrar em assuntos femininos. Mas ela resistiu, rebelou-se.

Determinada em saber como os eletrônicos funcionavam, pegou emprestado na biblioteca “O primeiro livro sobre eletrônicos do menino” e mudou a própria história, começando a focar seus estudos em ciências e matemática.

Mais tarde, no curso de Física na Morgan State University, uma universidade pública historicamente negra, ela se forma, com destaque, como uma das duas mulheres no curso. E, assim, se habilita para ocupar a vaga de analista de matemática e dados na NASA.

Valerie Thomas, atualmente, no auge dos seus 78 anos, atua como mentora encorajando estudantes de minorias e mulheres negras a seguir carreiras em ciências e tecnologia.

(Este texto foi escrito em outubro de 2021)

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Fontes: Linda Factor, Iemenlson, Vemprarua.org, PeoplePill, WebuyBlack, En.Wikipedia, Biography.com, Lampejos, BlackPast

1 comentário em “Valerie Thomas: da ilusão à realidade 3D”

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