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Moonlight: “Sob a luz do luar, garotos negros parecem tristes”

As aspas se referem ao título do livro que inspirou Moonlight, o  primeiro filme com temática LGBTQIA+ a ganhar o principal prêmio da Academia de Cinema, o Oscar de Melhor Filme. Neste artigo, também, uma proposta de roda de conversa, pensando no nosso projeto PN Educação.

Primeiros Negros

Moonlight – Sob a luz do luar nos conta a história de Chiron em três atos. (Imagem: Reprodução)
Moonlight – Sob a luz do luar nos conta a história de Chiron em três atos. (Imagem: Reprodução)

Moonlight: Sob a Luz do Luar conta a história de Chiron, um rapaz negro que mora em um bairro violento de Miami, sofre bullying na escola, se envolve com o crime na juventude e tem dúvidas quanto à sua sexualidade. É o primeiro filme com temática LGBTQIA+ a ganhar o principal prêmio da Academia de Cinema, o Oscar de Melhor Filme 2017 e, ainda, as estatuetas como Melhor Roteiro Adaptado e MelhorAtor Coadjuvante, para Mahershala Ali.

Mas Moonlight ultrapassa o rótulo de filme sobre a homossexualidade e propõe um mergulho na descoberta pessoal de cada um.

Baseado na peça In Moonlight Black Boys Look Blue – em tradução livre  “Sob a luz do luar, garotos negros parecem azuis”, de Tarell Alvin McCraney, a história autobiográfica assinada também pelo cineata Barryor Jenkins ganhou diversos outros prêmios, como o Globo de Ouro, de Melhor Filme Dramático, e o  MTV Movies de Melhor Beijo, entre Ashton Sanders e Jharrel Jerome.

A cor

Blue, em inglês, é azul, triste e, no cinema, as cores possuem diversas utilidades e uma das principais é provocar no público os sentimentos dos personagens. 

É evidente o trabalho de James Laxton, diretor de fotografia da obra, em relação às cores e simbolismos presentes no filme. O nome original da peça já carrega em si a cor azul, que se destaca durante toda a obra e não por acaso. 

Dividido em três atos, o filme cresce com o Chiron ouvindo repreensões por escolhas que faz sem compreender por que. Ainda aos 9 anos, época em que o chamam de “Pequeno”, é perseguido pelos colegas por seu físico frágil, comportamento introvertido e trejeitos delicados.

Curiosidades

Barry Jenkins, o diretor, é na verdade o personagem principal do filme, o Chiron que, na tela do cinema, é vivido por três atores: Alex Hibbert na infância, Ashton Sander na adolescência e Travante Rhodes na fase adulta.

O curioso é que os três atores que interpretaram Chiron não se conheceram durante a produção, que durou exatos 25 dias, mantendo o estranhamento de si mesmo do personagem principal.

Cena do filme Moonlight – Sob a luz do luar (Imagem: Reprodução)
Cena do filme Moonlight – Sob a luz do luar (Imagem: Reprodução)

O período curtíssimo para gravação – outro foco interessante – reflete as restrições orçamentárias do filme. Fato que sugere a possibilidade para além das condições financeiras e empresta um sabor a mais ao prêmio de Melhor Filme. 

A falta de dinheiro obrigou, inclusive, o elenco a compartilhar trailer de traje, cabelo e maquiagem, além da sala de descanso com toda a equipe. 

Esquenta

Até aqui, informações valiosas para a preparação e abertura da roda de conversa, que é o momento em que se comenta a temática do filme, a sinopse, e se lançam algumas perguntas para garantir a atenção do público à projeção.

Um começo interessante pode ser sobre o arco-íris, Não o simbolismo do fenômeno físico dentro do movimento LGBTQIAP+, mas os sentimentos que as cores despertam em nós, por que isso acontece, se é sempre igual.

Moonlight (Imagem: Cena do Filme/ Reprodução)
Moonlight (Imagem: Cena do Filme/ Reprodução)

Moolinght tem uma cor e um sentimento que o definem. Que cor é essa? Que sentimento é este? Estimular os espectadores a observarem a linguagem das ores do filme pode ser bem interessante.

Pode-se falar do título do livro que inspirou o filme. O que o título sugere? Será que todos concordam que azul é a cor da tristeza? Qual a maior tristeza de cada um?

Vale anotar as respostas e voltar ao tema pós-exibição?

A roda

Rodas de conversa são momentos dedicados ao debate sobre um determinado tema, papo reto, aberto, horizontal, dialógico, onde todos têm lugar de fala e de escuta, onde todos respeitam pontos de vista contrários.

Daí a ideia de sentar-se em círculo – igualdade e equidade no existir. Igualdade e equidade incluem tolerância. Respeito implica tolerância. E tudo tem de acontecer em mão dupla e fazer pensar, ressignificar. Só quem usa coração e mente muda de ideia, compreende diferente.

Trevante Rhodes e André Holland em "Moonlight." (Imagem: Cena do Filme/ Reprodução)
Trevante Rhodes e André Holland em “Moonlight.” (Imagem: Cena do Filme/ Reprodução)

Mesmo assim, é importante a figura do mediador, aquele que provoca, propõe outros pontos de vista, dá equilíbrio à atividade, garante espaço para que todos possam falar e todos possam ser ouvidos. 

A chamada “maiêutica socrática”, o perguntar sempre para que cada um encontre a sua resposta, é a pedra de toque da mediação.

A roda de conversa é um momento de concentração e atenção para o outro. Por isso, valem como regras: abrir mão do celular, das conversas paralelas e demais distrações.

Linguagem da cor

Na pós-exibição, o momento de checar o quanto a linguagem da cor foi compreendida. 

Durante a infância, vemos Chiron usando camisetas brancas em várias cenas, representando pureza e até mesmo inocência de seu personagem em razão da pouca idade. Contudo, a mochila inteira azul pode ser interpretada como uma certa tristeza que ele carrega nas costas sem ter, ainda, consciência disso.

No mesmo tom, Kevin, amigo de infância – interpretado por Jaden Piner, Jharrel Jerome e André Holland -, por quem Chiron se sente atraído, embora sinta medo e  vergonha de admitir. O personagem está quase sempre usando azul ou envolto em uma luz azul

Paletas de cores durante a fase da infância de Chiron. (Imagem: Reprodução)
Exemplo do uso das cores durante o filme Moonlight. (Imagem: Reprodução)

Mahershala Ali, Oscar de Melhor Ator Coadjuvante, vive o personagem Juan. Ele é o traficante do bairro e se torna mentor, a figura paterna de Chiron, e está sempre adornado pela cor azul (a exemplo de seu carro). Usa muita cor nas camisetas e em casa, mas, a partir do início de sua relação com o garoto, passa por uma visível transformação. Na última cena, veste roupas brancas, combinando com a nova cor branca também nas paredes.

Na adolescência, tons de amarelo ocupam o vestuário, assim como os detalhes no ambiente e edição de luz que pode simbolizar a introspecção, confusão e insegurança – vale testar a percepção da plateia sobre a questão de luz e sombra como marca de um período complicado para a maioria dos jovens. 

A cena em que Chiron conversa com sua mãe (Naomie Harris) investe no contraste entre as cores para indicar o conflito entre os dois e o terror psicológico, do qual o menino é vítima frequente. 

Esse terror, bem como todo perigo de viver, é representado pelo vermelho e está frequentemente associado também ao personagem Terrell (Patrick Decile), que carrega a cor em sua mochila e roupas.

Identificando preconceitos

Moonlight é um filme que aborda a questão LGBTQIAP+ – vale, sempre, naturalmente, esclarecer cada letra da sigla – e permite ao espectador/sociedade entrar em contato com suas dificuldades em entender e/ou aceitar a homossexualidade e a dor a que esta população é submetida por falta de acolhimento e excesso de intolerância. 

Sofrimento emocional, LGBTQIAP+I, preconceito e bullying são palavras-chave deste filme que se passa em uma comunidade pobre da Miami da explosão do crack dos anos 1980, embora as gravações tenham acontecido em 2015.

Mas descoberta pessoal, masculinidades e drogas podem ser incluídas como foco de um debate que tem muito a ver com o espaço escolar, com o quem somos e a necessidade – urgente – de humanizarmos nossas relações.

Durante os 111 minutos de filme, ainda, a possibilidade de comparação dos espaços da América de lá, do Norte, com a América daqui, do Sul.

Cena do beijo que deu aos atores o prêmio de Melhor Beijo no MTV Movie Awards. (Imagem: Cena do Filme/ Reprodução)
Cena do beijo que deu aos atores o prêmio de Melhor Beijo no MTV Movie Awards. (Imagem: Cena do Filme/ Reprodução)

Moonlight registra retratos das comunidades periféricas afro-americanas, em geral, ambientes predominantemente masculinos, onde a cultura das gangues –  hierarquia, códigos morais particulares e violência intrínseca – exerce um forte papel influenciador e propagador desses símbolos de masculinidade.

Quer dizer, Chiron vive em um universo de estereótipos no qual não se encaixa, a começar pelo traficante/pai/mentor que contraria as expectativas e apresentar um comportamento ético bem definido, uma estrutura familiar concreta ao lado da namorada e um modo compreensivo de tratar a questão da sexualidade do menino, incentivando-o a não se envergonhar e ajudando-o a se encontrar. Isso ao mesmo tempo em que tem na mãe do garoto, uma de suas clientes viciadas em crack.

E tudo isso é só o começo…

A riqueza de filmes e rodas de conversa são as possibilidades, caminhos possíveis, a partir de pontos de vista que devem ser vistos como são: apenas pontos que, somados, podem transformar-se em conhecimento quando nos propomos relações dialógicas, de fala e escuta ativa.

Entre os 50 melhores

Em comemoração ao Mês do Orgulho LGBTQIAP+, o site IndieWire, referência em notícias e opinião em relação à indústria cinematográfica, lançou a lista dos 50 melhores filmes LGBTQ+ do século 21, em 1° de junho de 2023. E no topo do lista aparece Moonlight: Sob a Luz do Luar, eleito o melhor.

“É impossível não exagerar o significado de Moonlight – como uma obra-prima cinematográfica, como inspiração para cineastas independentes como Barry Jenkins, mas principalmente para gays negros – que merecem muito mais exemplos de arte profunda que espelhe sua experiência”, escreveu o site sobre o vencedor do Oscar de Melhor Filme em 2017.


Fontes: Educapes, Instituto de Cinema, Guia do Estudante, Papo de Cinema.

LGBTQIAP+ o significado de cada letra da siglaL, G e B: lésbicas, gays e bissexuais; T: travestis, transexuais e transgêneros; I: intersexuais; Q, A, P e +: queer, assexual, pansexual e identidades não binárias.

Escrito em 13 de junho de 2022

1 comentário em “Moonlight: “Sob a luz do luar, garotos negros parecem tristes””

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