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InícioÉrica Prado, líder do pioneiro Movimento Surfistas Negras

Érica Prado, líder do pioneiro Movimento Surfistas Negras

Bicampeã nas águas e jornalista profissional, ela enaltece mulheres negras e nordestinas que têm nas águas do mar sua fonte de trabalho e vida.

Érica Prado (Imagem: Divulgação)
Érica Prado (Imagem: Divulgação)

Érica Prado de Oliveira nasce carioca em 8 de dezembro de 1988, filha de Denise Prado e Evaldo Gomes de Oliveira. Aos 8 anos, os pais se separam e ela vai com a mãe para a Bahia – primeiro para Salvador e, depois, para Itacaré. Lá, aos 9 anos, começa a arriscar-se em cima de uma prancha com incentivo do irmão. 

Na época, Itacaré vivia o clima dos muitos eventos de surfe internacional, por conta das suas ondas que chegam a 3 metros de altura e não demora para Érica imaginar-se surfista profissional. Em 2002, começa competindo entre amadores – pedindo patrocínio no comércio local – e , logo, se destaca nos pódios.

Entre 2003 e 2006, é bicampeã municipal em Itacaré, bicampeã ilheense e campeã baiana. Depois, aos 18 anos, volta para a sua terra natal, o Rio de Janeiro, onde vive com parentes de seu pai, para ficar mais próxima das competições e também de um diploma universitário. 

O problema de apoio financeiro para a atleta, no entanto, continua. Ela tem que correr atrás do dinheiro para viajar e participar de todos os campeonatos, condição fundamental para brilhar neste esporte.

Érica Prado surfando (Imagem: Divulgação)
Érica Prado surfando (Imagem: Divulgação)

Ao mesmo tempo, formada em Jornalismo, começa a cobrir muitos eventos esportivos e percebe que “é melhor tratada como parte da imprensa”, apesar de ser uma atleta campeã e competidora do extinto SuperSurf – Campeonato Brasileiro de Surf.

“A realidade para mulheres negras no surfe é mais difícil do que para as brancas. A gente sofria com a falta de apoio e ‘percebia’ o racismo. Ia pedir ajuda, mas sempre falavam que não podiam apoiar por causa da crise.”

Vida real, a surfista profissional se vê diante de uma escolha: pagar as contas e seguir em frente como jornalista ou continuar dando murro em ponta de faca em busca da profissionalização no surfe. Ela não pestaneja: foca no jornalismo. Isso aos 21 anos de idade. 

E é como jornalista esportiva que ela assiste a três anos de crise no surfe feminino, que ficou sem competição no Brasil. Fora das águas, Érica segue questionando a “invisibilidade” das surfistas negras; ouve que “surfistas negras não existem” (!?) e decide colocar os pingos nos “is”! 

Mulheres negras no surfe sempre existiram – e surgiram crianças, a maioria, porque o mar era como o quintal da casa delas, surfar fazia parte das brincadeiras de infância…

Surfistas negras

O racismo está em todos os ambientes. No surfe não é diferente – sempre as brancas nos holofotes. “Mulheres negras não tinham espaço na TV, todo o tempo colocadas de lado e eu só percebi isso, de fato, quando mudei de lado”.

A profissionalização e a consciência racial são as “novidades” no mundo do esporte – aponta Érica Prado. “Existem surfistas negras de pele clara que estão no surfe há muito tempo e foram invisibilizadas ou se invisibilizaram, nunca abordando a questão racial”.

Érica Prado e Laiz e Yanca Costa (Foto: Brenno Carvalho | Agência O Globo)
Érica Prado e Laiz e Yanca Costa (Foto: Brenno Carvalho | Agência O Globo)

Nuala Costa – indica Érica Prado – é uma das primeiras pessoas que eu vi e ouvi falando da questão racial no surfe. O ativismo de mulheres negras no surfe começa com ela, oficialmente, em 2016, com a criação do coletivo antirracista TPM – Todas para o mar.

Na opinião da surfista e jornalista profissional, hoje “as mulheres de sua geração estão muito mais conscientes sobre a necessidade de se discutir racismo e discriminação. Mas ainda tem muita luta pela frente. O surfe não se limita a esse recorte que a indústria criou pra gente”.

Encontro de Negras

Para combater o racismo no surfe, camuflado de ignorância, Érica Prado idealiza, em 2019, o Movimento Surfistas Negras e “apresenta” à indústria as surfistas negras – mulheres negras e nordestinas. 

E está disposta a colocar o dedo nessa ferida e denunciar o surfe como um ambiente racista, conservador e heterossexual.

 “Por mais que a mídia não mostre, por mais que os programas dos canais especializados em surfe não mostrem, essas mulheres existem e são incríveis. E a representatividade no surfe importa porque a gente precisa nutrir os sonhos de meninas e de mulheres que sempre quiseram pegar onda mas nunca se viram nesse espaço”.

Em 23 de novembro de 2019 acontece o 1° Encontro Nacional de Surfistas Negras e Nordestinas, no Rio de Janeiro, na praia da Barra da Tijuca. Na verdade, uma grande confraternização entre mulheres que amam o surfe, sejam elas competidoras, free surfer ou admiradoras do esporte, que nunca tiveram a oportunidade de experimentá-lo.

“O Encontro foi incrível, emocionante demais. Reunimos várias gerações do surfe brasileiro, do surfe nordestino, cerca de 30 meninas. A Nuala Costa veio de Pernambuco para participar e deu aula de surfe para as meninas, participou de roda de conversa…”, lembra Érica.

Por que um encontro de surfistas nordestinas no Rio de Janeiro?

A explicação é simples: as surfistas nordestinas costumam vir para o Rio de Janeiro em busca de patrocínio e para evoluir no surfe. E também porque Rio de Janeiro, São Paulo e Santa Catarina são os três estados do sudeste que têm frequência boa de ondas. 

Em 2020, devido à pandemia, o Encontro foi virtual, com quatro rodas de conversa que abordaram temas como: colorismo, racismo, a trajetória das mulheres negras nas competições, jornalismo esportivo, representatividade, autocuidado… 

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No Instagram, o @surfistasnegras ultrapassa 500 publicações e 14 mil seguidores. E já é possível perceber alguma mudança no comportamento não só dos patrocinadores, como da sociedade e das próprias mulheres negras: 

Eu não me sentia e não me sinto representada nos programas de TV, nas revistas e sites especializados, nas marcas e na indústria como um todo. Mas, nos últimos anos, as mulheres negras têm ocupado, cada vez mais, um novo lugar no mundo do surfe. Os movimentos se tornaram mais ativos. O racismo está escancarado e as marcas estão preocupadas com a diversidade”.

O @surfistasnegras atua como vitrine e Érica Prado faz as vezes de agenciadora e organiza eventos para aulas de surfe para iniciantes, o que ajuda a patrocinar surfistas profissionais:

“Eu vejo quem são as meninas que se encaixam no perfil que aquela marca está solicitando… Se a marca quer uma pessoa que participe de competições ou não… Aí, eu indico, passo telefone e as pessoas fecham suas parcerias, isso já aconteceu muito”.

E tem outros feedbacks positivos do @surfistas negras, não só do ponto de vista financeiro, como salienta Érica: 

“O movimento criou uma rede muito forte de mulheres negras que nem sabiam que existiam mulheres negras no surfe. A gente esquece que o acesso à praia não é dado a todo mundo. Muitas mulheres negras diziam que nunca tiveram a ousadia de surfar porque não sabiam que mulheres negras surfavam. Isso tem a ver com visibilidade, com o que se mostra no cinema, na televisão…”

Atualmente, Érica Prado trabalha para o circuito da elite do surfe brasileiro, como repórter, comentarista e locutora de vários campeonatos nacionais. E sem nenhuma saudade da vida de competidora, da pressão dos campeonatos:

“Eu gosto de estar do lado que conta a história. Estou confortável”.


Fontes: Terra, Canais Globo, Mundo Negro, Mana Surf, Estadão, Blog Redley, Instagram – Nuala Costa, TPM Todas para o mar e entrevista com Érica Prado, em maio de 2023.

1 comentário em “Érica Prado, líder do pioneiro Movimento Surfistas Negras”

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