A jornalista, professora e representante do povo, Antonieta de Barros tem uma história de muita luta. Mãe de três filhos, travou incansáveis batalhas contra o analfabetismo, uma pioneira na política e no feminismo.
Nasce em 11 de julho de 1901, em Florianópolis (SC), na então cidadea Desterro. Em sua certidão de batismo, apenas o nome da mãe, Catarina Waltrich, escravizada liberta. Desde sempre, ela acredita no poder revolucionário e libertador da educação.
E para fazer cumprir seu direito à educação, Antonieta rompe barreiras.
Preta, sustenta seus três filhos como lavadeira. E só consegue alfabetizar-se na vida adulta – ela mantém uma pequena pensão para estudantes que acabam por ensinar-lhe o bê-á-bá, ponto de partida para seu mergulho, por conta própria, nos livros.
Mulher das letras
Como educadora, aos 21 anos, funda, logo após ter-se diplomado no magistério, o Curso Particular Antonieta de Barros, em sua casa, com foco no combate ao analfabetismo de adultos carentes, instituição que dirige até a sua morte, em 28 de março de 1952 e que foi fechado em 1964.
Sua fama profissional, entretanto, a leva a lecionar também para a elite de Florianópolis, no Colégio Coração de Jesus, na Escola Normal Catarinense e no Colégio Dias Velho, do qual é diretora no período de 1937 a 1945. Antonieta leciona Português e Literatura.
Vale pensar, anos 1920… Era inusitado mulheres trabalharem, terem destaque. Ainda mais uma negra! Entretanto, indo além da sala da aula, Antonieta torna-se jornalista, cria e dirige em Florianópolis o jornal A Semana, mantido até 1927. Três anos depois, passa a dirigir o periódico Vida Ilhoa, na mesma cidade.
Sua carreira jornalística inclui o trabalho para oito veículos e mais de mil artigos publicados sobre educação, condição feminina, política…
Abaixo a virgindade no pensar!
Na década de 1930, mantém intercâmbio coma Federação Brasileira pelo Progresso Feminino, como revela a correspondência entre ela e Bertha Lutz, hoje preservada no Arquivo Nacional – ela defende a emancipação feminina através, principalmente, da educação.
Como representante do povo, jornalista, professora, Antonieta sempre se posiciona não dando ouvidos aos detentores do poder, que afirmavam que ‘mulheres nasceram para servir, ser mãe e rainha do lar’, ‘não deveriam opinar’…
Mas nada fez eco em sua mente e em seu coração, apesar das calúnias. Entre seus argumentos, ela defesa da tese de que as mulheres não deveriam ser “virgens de ideias”.
A parlamentar
Na primeira eleição em que as mulheres brasileiras puderam votar e ser votadas, Antonieta filia-se ao Partido Liberal Catarinense e elege-se deputada estadual, de 1934 a 1937. Ela é a primeira mulher negra a assumir um mandato popular no Brasil. Mas seu mandato é interrompido pelo golpe de Getúlio Vargas, com a criação do Estado Novo, que leva todos os partidos políticos para a clandestinidade.
Antes disso, parlamentar escreve dois capítulos da Constituição catarinense sobre Educação, Cultura e Funcionalismo e assina outro pioneirismo: em 19 de julho de 1937, ela se transforma na primeira mulher – e negra – a presidir uma Assembleia Legislativa no Brasil.
Com a queda do Estado Novo, Antonieta concorre a deputada estadual nas eleições de 1945, obtém a primeira suplência pela legenda do Partido Social Democrático (PSD) – assume a vaga na Assembleia Legislativa em 1947 e cumpre seu mandato até 1951.
Antonieta de Barros é a única parlamentar negra da história do Legislativo de Santa Catarina – o primeiro homem negro a assumir o cargo de deputado estadual foi Sandro Silva, pelo PPS, em 2012.
Dia do Professor
Em seu segundo mandato, Antonieta de Barros apresenta a proposta da lei que passou a comemorar, a partir de 1948, o Dia do Professor em Santa Catarina, em 15 de outubro, transformando a data em feriado escolar – Lei Estadual nº 145, de 12 de outubro de 1948. Na justificativa, a deputada afirma:
A lei, homologada pelo então governador José Boabaid, é publicada 15 anos antes do decreto que oficializa a data no Brasil inteiro – este, assinado pelo presidente João Goulart.
A data de 15 de outubro de 1827 é uma referência ao decreto do imperador D. Pedro I que instituiu o Ensino Elementar no Brasil.
Usando o pseudônimo literário de Maria da Ilha, Antonieta de Barros escreveu o livro Farrapos de Ideias.
Legado
Hoje, em Santa Catarina, Antonieta de Barros empresta seu nome a um programa de formação de jovens aprendizes de comunidades carentes; a um auditório do Palácio Barriga Verde, sede do parlamento estadual, e a Associação de Mulheres Negras; entre outros espaços públicos.
A Secretaria da Igualdade Social do Governo Federal, em 2016, criou o Prêmio Antonieta de Barros para Jovens Comunicadores Negros e Negras. E uma medalha com seu nome é concedida, todos os anos, a mulheres com relevantes serviços em defesa dos diretos da mulher catarinense.
Na rua Tenente Silveira, em 2019, um mural de 32 metros de altura reproduz a sua imagem.
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No Museu da Escola Catarinense, se encontra reconstituída a sala da diretoria ocupada por Antonieta no antigo Colégio Estadual Dias Velho, que também ganhou seu nome.
E a pioneira segue inspirando: virou o livro infantil Antonieta, de Eliane Debus; enredo de 2020 do Grêmio Recreativo e Escola de Samba Consulado, Lute como Antonieta; documentário e episódio em séries.
Existe, ainda, um texto sobre ela no livro Literatura e Afrodescendência no Brasil: Antologia Crítica.
Heroína
Em 5 de janeiro de 2023, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ao assumir seu terceiro mandato, sanciona a lei que inscreve o nome de Antonieta de Barros, a primeira deputada negra do Brasil, no Livro dos Heróis e Heroínas da Pátria, que se encontra no Panteão da Pátria e da Liberdade Tancredo Neves, em Brasília. A sanção está no Diário Oficial da União do mesmo dia.
Fontes: G1, NSC, Dicionário Mulheres do Brasil de 1500 até à atualidade, Wikipédia, El Pais
Atualizado em 6/1/2023
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