Madam C. J. Walker é a primeira americana a se tornar milionária, primeira americana autodidata a se tornar milionária. E ela mulher negra, nascida livre de um casal de pessoas escravizadas, que trabalhavam nos campos de algodão.
Madam C. J. Walker em seu registro de nascimento aparece como Sarah Breedlove, nascida em 23 de dezembro de 1867, em Delta, Louisiana, Estados Unidos da América.
Madam C. J. Walker é o nome que conquistou no seu terceiro casamento, com Charles Joseph Walker. Mas Sarah sempre foi melhor nos negócios do que nos casamentos.
Como ela fez sua fortuna, tornando-se pioneira em pleno início do século XX?
Madam C. J. Walker desenvolveu e comercializou uma linha de cosméticos e produtos de cabelos para mulheres negras, criando a Madam C. J. Walker Manufacturing Company.
A inspiração
Na época, era comum as mulheres negras sofrerem caspa severa e outras doenças do couro cabeludo, incluindo calvície, devido a distúrbios da pele e à aplicação de produtos agressivos, como lixívia (uma espécie de alvejante), presentes nos sabonetes para lavar os cabelos e as roupas.
Isso sem contar a dieta inadequada, as doenças, os banhos e lavagens de cabelo pouco frequentes – a luz elétrica e a água encanada não eram benefícios comuns na maioria das casas americanas e as mulheres costumavam ficar cerca de uma semana com seus penteados.
Esta situação – que podia constatar olhando-se no espelho – fez Sarah Breedlove buscas tratamentos caseiros para a queda dos cabelos e a transformou na empresária conhecida pela marca de seus produtos, Madam C. J. Walker.
Sua história é sinônimo de sucesso, ativismo, humanidade, empreendedorismo, arte, cultura. Madam C. J. Walker é inspiração para livros, peças teatros, filmes e, principalmente, para outras mulheres.
No momento – março de 2020, em meio a uma pandemia de coronavírus – Covid 19 – , a Netflix, em produção original, conta a sua história em quatro capítulos.
Primeiros passos
No começo, o aprendizado de Sarah sobre cuidados com os cabelos foi com seus irmãos, que eram barbeiros em St. Louis. Depois, começou a vender produtos para Annie Malone, uma empresária afroamericana, milionária e proprietária da Poro Company.
Enquanto trabalhava para Annie Malone – que, mais tarde, se tornaria sua maior rival na indústria de cabelos -, Sarah buscava novos conhecimentos e começou a desenvolver sua própria linha de produtos.
À frente de seu tempo
Já como Madam C.J. Walker, Sarah tornou-se conhecida como cabeleireira independente e varejista de cremes cosméticos. E para popularizar seus produtos – um shampoo e uma tomada para tratar e estimular o crescimento dos fios -, desenvolveu um sistema de vendas porta a porta e apostou no serviço de entregas pelos correios.
Só que para Sarah, a questão não era só estética. Para ela, cabelos e poder se confundiam. Ainda mais no caso das mulheres negras, discriminadas inclusive no mercado de trabalho por conta de suas madeixas fora do padrão europeu.
Ela queria liberdade, independência econômica, não só para ela, mas para todas as mulheres e, especialmente, para as mulheres negras. Para isso, criou o Lelia College, em Pittsburgh, Pensilvânia, e programas de treinamento para sua rede nacional de vendedoras, a fim de que todas se tornassem “culturistas capilares” usando o “The Walker System”.
O que era o “The Walker System”?
Um método de preparação do cabelo, criado para garantir o seu crescimento e condicionar o couro cabeludo através de um xampu, uma pomada, escovação extenuante e aplicação de pentes de ferro quente no cabelo.
As “culturistas” tinham a responsabilidade de ensinar as clientes a cuidar do próprio cabelo com os produtos Walker. E, no final do mês, receber boas comissões – pagar bem era outra de suas marcas.
(Madam C. J. Walker entendeu o poder da publicidade e do marketing, com reconhecimento da marca, já naquela época, e transformou-se em padrão de beleza e garota propaganda de seus produtos.)
Entre 1911 e 1919, durante o auge de sua carreira, a Madam C. J. Walker Manufacturing Company empregou cerca de 20.000 mulheres como culturistas.
Vestidas com um uniforme característico – camisas brancas, saias e sacolas pretas -, elas visitaram casas nos Estados Unidos e no Caribe oferecendo pomada para cabelos e outros produtos embalados em recipientes de estanho com a imagem da própria Madam.
Mais que lucro
Além de treinar vendas e cuidados pessoais, Madam C. J. Walker mostrou a outras mulheres negras como fazer um orçamento, construir seus próprios negócios e incentivou-as a se tornarem financeiramente independentes.
Em 1917, inspirada no modelo da Associação Nacional de Mulheres de Cor, começou a organizar suas vendedoras em clubes estaduais e locais. O resultado foi a criação do que se tornou a União das Culturistas de Madam C. da América, uma associação de caridade.
Sua primeira conferência anual, realizada na Filadélfia durante o verão de 1917, com 200 participantes, acredita-se, tenha sido uma das primeiras reuniões nacionais de negras para discutir negócios.
Durante a convenção, Madam C. J. Walker premiou as mulheres que haviam vendido mais produtos e trazido novas agentes de vendas. E também recompensou quem fez as maiores contribuições para instituições de caridade em suas comunidades.
Ativista
Sua inteligência, visão, audácia em um mundo masculino por excelência garantiu emprego com salário digno para mulheres negras, mas também o funcionamento de orfanatos, escolas de formação, asilos, grandes projetos culturais e educacionais.
Villa Lewaro, sua luxuosa propriedade em Irvington-on-Hudson, Nova York, se tornou local de encontro de líderes comunitários e inspiração para que outros afro-americanos perseguissem seus sonhos.
Detalhe: para projetar sua casa, que custou US$ 250.000, ela contratou Vertner Tandy, o primeiro arquiteto negro licenciado na cidade de Nova York.
Sim, Madam C. J. Walker ficou conhecida também pelo seu comprometimento com causas políticas, sociais e trabalhistas – era parceira dos funcionários, parceira do povo negro, palestrava sobre questões políticas, econômicas e sociais em convenções patrocinadas por poderosas instituições negras.
Durante a Primeira Guerra Mundial, foi líder no Círculo de Ajuda à Guerra dos Negros e defendeu a criação de um campo de treinamento para oficiais do exército negro.
Em 1917, ingressou no comitê executivo da Associação Nacional para o Avanço das Pessoas de Cor, que organizou a Parada do Protesto Silencioso na 5ª Avenida de Nova York – manifestação pública que atraiu mais de 8.000 afro-americanos em protesto pela morte 39 afro-americanos no leste de Saint Louis.
Os lucros de seus negócios impactaram significativamente as contribuições de seus interesses políticos e filantrópicos – ela entregou quase US$ 100.000 a instituições e indivíduos, garantindo inclusive bolsas de estudos e tornando-se patrona das artes. Além disso, direcionou dois terços dos lucros líquidos futuros de seus bens para a caridade.
A vida de Sarah
Sarah Breedlove nasceu em 23 de dezembro de 1867, em Louisiana. Seus pais eram escravizados e cinco de seus irmãos nasceram nessa condição.
Sarah foi a primeira de sua família a nascer em livre, após o fim do período escravocrata nos EUA. Cinco anos depois, em 1872, sua mãe morreu, provavelmente de cólera. O pai casou novamente, mas morreu um ano depois.
Órfã aos 7 anos, Sarah mudou-se para o Mississippi, para morar com a irmã mais velha e o cunhado. Aos 10 anos, já trabalhava como doméstica.
Aos 14 anos, casou-se com Moses McWilliams, para escapar dos abusos do cunhado. Aos 18 anos, teve uma filha A’Lelia e, aos 20, conheceu a viuvez.
Em 1888, Sarah e sua filha se mudaram para o Missouri, onde três de seus irmãos moravam. Lá, encontrou trabalho como lavadeira, ganhando pouco mais de um dólar por dia. Só que ela queria mais, queria garantir que sua filha tivesse mais que três meses de educação formal como ela.
Um segundo casamento surge como possibilidade de mudança de vida em 1894. O marido é John Davis. Mas ele não e bom e ela se muda, com a filha, para Denver, Colorado, em 1905, onde, um ano depois, se casa com Charles Joseph Walker, um vendedor de publicidade de jornais.
O terceiro casamento dura seis anos, mas é com o seu nome de casada que ela faz história – enquanto estiveram juntos, ele era seu parceiro de negócios, prestava consultoria em publicidade e promoção.
O nome Walker
Os produtos da Madam C. J. Walker Manufacturing Company estão na lista dos primeiros desenvolvidos para as mulheres negras e, junto com os desenvolvidos por Annie Malone, são um marco na indústria de cosméticos.
A Madam C. J. Walker Manufacturing Company foi, na sua época, a maior empresa de propriedade de um afro-americano dos Estados Unidos, uma mulher!
Na história da Madam C. J. Walker Manufacturing Company, que se inicia em 1910, consta também a criação de um laboratório para pesquisas e um salão de beleza no crescente bairro do Harlem em Nova York, que se tornou um centro da cultura afro-americana.
O nome de Madam C. J. Walker tornou-se ainda mais conhecido nos anos 1920, após sua morte, quando sua empresa se expandiu além dos Estados Unidos indo para Cuba, Jamaica, Haiti, Panamá e Costa Rica.
Madam C. J. Walker morreu em 25 de maio de 1919 – por insuficiência renal e complicações da hipertensão, aos 51 anos -, considerada a empresária afroamericana mais rica da América. Seu patrimônio valia cerca de 600 mil dólares, o equivalente a US $ 8,8 milhões nos dias atuais. Sua história, em mais detalhes, pode ser encontrada no site www.madamcjwalker.com criado e mantido por sua tataraneta.
Fontes:
http://www.marcosproenca.com.br/mulheres-importantes-para-a-beleza-%E2%80%A2-madam-cj-walker/
https://en.wikipedia.org/wiki/Madam_C._J._Walker
Que incrível! Belíssimo texto.
Obrigada querida. Segue a gente. Agora somos um site primeirosnegros.com
Adorei o texto. Parabéns!
Mila Ferrari
Pingback: Invenções negras no nosso dia a dia • Primeiros Negros