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Racismo obstétrico

– Primeiros Negros

Mulheres negras sofrem violência obstétrica baseada em estereótipos racistas (Imagem: Reprodução | Ana Luiza Costa)

No período em que os os órgãos genitais vivem transformações próprias da gravidez, mulheres negras podem ser vítimas desta violência.

Diferenças no tratamento entre mulheres, de acordo com a cor da pele e com a raça, durante os atendimentos do pré-natal,  no parto, no puerpério ou na assistência ao aborto colocam as mulheres negras em risco de morte. Racismo obstétrico tem a ver com negligência deliberada de profissionais da área da saúde no atendimento a parturientes pretas.

O grupo de trabalho de combate ao racismo obstétrico da Mãedata, que integra o gabinete da vereadora Thaís Ferreira (@sou_thaisferreira), parlamentar da cidade do Rio de Janeiro, assina o Pequeno Manual de Antirracismo Obstétrico com informação qualificada para que gestantes e familiares identifiquem possíveis sinais  e impeçam que qualquer violência aconteça.

Pequeno Manual de Antirracismo Obstétrico (Imagem: Reprodução | Mãedata Vereadora Thais Ferreira)

Profissionais de saúde não podem falar o que bem entendem para gestantes, parturientes e puérperas nem ter ações opressivas, discriminatórias ou violentas em referência à sua etnia. Tais atitudes expõem mães e bebês à possibilidade de desfechos negativos. Qualquer desconforto com o atendimento deve ser denunciado!

E é importante saber que crimes raciais, muitas vezes, ocorrem de maneira imperceptível! Daí a necessidade urgente de toda a sociedade estar informada sobre como reconhecer e enfrentar este tipo de violência e promover dignidade desde o começo da vida!

DISQUE 100, serviço do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, de violações de direitos humanos, e DENUNCIE

Pessoas negras têm mais chances de sofrer violência obstétrica! O motivo principal é o racismo estrutural e institucional dentro dos serviços de saúde, desqualificando a humanidade da mulher negra a partir da “celebração” de sua força e resistência.

Possíveis sinais…

Entre os exemplos da vida real de prática de racismo obstétrico,  diversos estereótipos projetados nas mulheres negras, como qualificar a todas, de modo pejorativo, como “parideiras” e o mito de que  mulheres negras suportam a dor e qualquer tipo de sofrimento.

“Força, você tem cara de parideira.”
“Vai ser só um piquezinho para ajudar a sair.”
“Com essas ancas, vai ser fácil parir.”

E isso desde o século 19, quando o médico norte-americano James Marion Sims, considerado o “pai da ginecologia moderna”, realizava cirurgias experimentais em mulheres negras escravizadas sem anestesia, atenção ou cuidado, por considerá-las mais resistentes óbvio,  na leitura colonizada de humanidade. 

Tais expressões – fake news com mais de 200 anos! – ferem a subjetividade, a individualidade da mulher negra. É violência psicológica.

DISQUE 100, serviço do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, de violações de direitos humanos, e DENUNCIE

Atitudes do tipo:

    • negligenciar no atendimento
    • ser submetida a consultas que duram 10 minutos
    • não verificar a pressão arterial
    • desencorajar a presença de acompanhantes nas consultas
    • não solicitar exames
  • não oferecer técnicas farmacológicas de alívio da dor
  • realizar cortes sem anestesia local
  • práticas inadequadas como raspagem dos pelos, corte do períneo, uso de fórceps e outras manobras desnecessárias sem consentimento, ainda a partir da mentalidade de que a mulher negra é menos humana e, portanto, não digna de escolhas sobre o seu próprio corpo 
  • negligenciar queixas de dor e desconforto no resguardo
  • questionar a cor da pele do bebê…

Prova em números

Uma em cada quatro mulheres no Brasil é vítima de violência obstétrica, que é também violência de gênero e violência racial.

O Ministério da Saúde  informa, ainda, que 65,9% das mulheres que sofrem violência obstétrica são mulheres negras e que somente 27% destas mulheres obtiveram acompanhamento durante a gestação.

Gráficos sobre violência obstétrica
Gráficos sobre violência obstétrica

Em outras palavras, como explica a vereadora Thais Ferreira, “para além da violência obstétrica, há o racismo obstétrico, onde a violência obstétrica se intensifica”.

De acordo com dados computados pelo mesmo Ministério da Saúde de 2008 a 2017, as mulheres negras têm duas vezes mais riscos de morrer durante o parto!

E os números seguem escancarando o racismo obstétrico e o nível de crueldade da sociedade brasileira:

  • a chance de a mulher negra não receber anestesia durante o trabalho de parto é 50% maior que o de outras mulheres e, por consequência…
  • 62,8% das mortes maternas são de mulheres negras…

Como agravante a mais deste quadro, o fato de que todas estas situações poderiam ter sido evitadas:

62,8 % das mortes maternas são de mulheres negras.

“Mulheres, dos 15 aos 29 anos, morrem com uma frequência maior, prioritariamente por hipertensão, um problema que poderia ser identificado no pré-natal. Mas estas mulheres são as que menos têm informações sobre sinais de parto, que com mais frequência têm o pré-natal considerado inadequado e são as que mais peregrinam até conseguirem vaga na maternidade para dar à luz”.

A denúncia da doutora em saúde pública Fernanda Lopes foi feita durante as discussões da 4ª Conferência Nacional da Promoção da Igualdade Racial, com base em estatísticas do Ministério da Saúde e da Organização Mundial da Saúde.

Ela destaca também que mulheres negras de 15 a 29 anos representam 54,1% das mortes maternas no Brasil e que a população negra feminina tem duas vezes mais chance de morrer por causas relacionadas à gravidez, ao parto e ao pós-parto do que mulheres brancas.

Momento Covid-19

O artigo Racismo Antinegro e Morte Materna por Covid-19: O Que Vimos na Pandemia?, do Centro de Integração de Dados e Conhecimentos para Saúde (Cidacs/Fiocruz Bahia)  publicado na revista Ciência & Saúde Coletiva, mostra que a pandemia agravou a razão de morte materna no Brasil, com mais vítimas entre as gestantes pretas e pardas.

As pesquisadoras Emanuelle Góes, Andrea Ferreira e Dandara Ramos, responsáveis pelo estudo, contam que as mulheres pretas apresentaram mais sintomas graves da doença durante o puerpério, acumularam mais fatores de risco e foram as principais vítimas fatais. Em comparação com as mulheres brancas, foram 14,02% registros a mais de óbitos, em particular no puerpério.

“O racismo obstétrico influencia a tomada de decisão dos profissionais de saúde e com isso hierarquiza as pessoas e desumaniza as mulheres pretas e pardas no momento do pré-natal, parto, aborto e puerpério”, diz o estudo, acrescentando que, “em contextos como a pandemia da Covid-19, essas situações são agravadas e as decisões sobre quem deverá receber as melhores condutas no atendimento estão alicerçadas no racismo antinegro, na biopolítica do deixar viver, deixar morrer”.

A pesquisa analisou 10.745 casos positivos de Covid-19 de gestantes e puérperas, registrados na base de dados da Síndrome Respiratória Aguda Grave entre 2021 e 2022. O relatório traz informações sobre raça/cor, idade, região do país, sinais e sintomas clínicos, número de internações em unidade de terapia intensiva (UTI) e óbitos. Ficou constatado que as gestantes pretas e pardas são as que menos acessaram a UTI.

Não nascidos

As estatísticas de morte também alcançam os bebês. No início de 2022, Ayah Akili, 25 anos, de Aparecida de Goiânia, em Goiás, denunciou nas redes sociais ter sofrido violência e racismo obstétrico em uma maternidade da cidade, após perder a filha com 33 semanas de gestação.

Na época, Ayah contou que as diferenças no tratamento começaram durante o pré-natal. Alguns exames básicos de gravidez, como de curva glicêmica e pré-eclâmpsia, nunca foram solicitados até que um exame de ultrassom realizado no oitavo mês de gestação confirmou que a bebê não tinha mais batimentos cardíacos.

Imagem: Reprodução | Portal Alma Preta
Imagem: Reprodução | Portal Alma Preta

Mães políticas

Na série de vídeos do YouTube, Diário Antirracista, a vereadora Thais Ferreira fala mais sobre racismo obstétrico.

E em seu trabalho na Câmara Municipal do Rio de Janeiro propõe um estilo de atuação política centrada na potência das mães, partindo do princípio que cuidar, gerir e liderar pessoas, desde o começo da vida, é o que vai garantir a efetividade das soluções políticas para toda a sociedade:

“A política institucional pode e deve ser feita por mulheres mães. É assim na MãeData (grupo do seu gabinete). Construímos política afetiva e efetiva feita por e para muitas mães. Lugar de mãe também é na política!”

Entre os compromissos da MãeData estão: a luta pela erradicação do racismo, por um parto sem violência para todas as pessoas e um nascer digno e respeitoso para nossas crianças.

Denúncia

O Brasil ainda não tem uma lei específica para a violência ou racismo obstétrico, mas as vítimas dessas ações podem denunciar os casos por outros caminhos, recorrendo às leis de injúria racial ou racismo. Além disso, as vítimas podem registrar queixa nas ouvidorias das unidades de saúde públicas e privadas.

Lei do Acompanhante (n° 11.108/2005) assegura à gestante o direito à presença de acompanhante durante o trabalho de parto e pós-parto imediato no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS), no Brasil inteiro.

“A presença de outra pessoa no parto, quando as gestantes estão muito vulneráveis, ajuda a dar apoio e identificar situações de violência”, afirma Emanuelle Góes.

E, vale insistir, tem o DISQUE 100, serviço do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, de violações de direitos humanos, e DENUNCIE.

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Abril 2023

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