Antonio Pereira Rebouças, pai do André, do Antonio e do José Rebouças, e conselheiro de D. Pedro II, é também um pioneiro na advocacia.
O que este artigo responde: Quem é Antônio Pereira Rebouças? Quem é o pai dos irmãos Rebouças? Qual é o pioneirismo de Antônio Pereira Rebouças? Onde nasceu Antônio Pereira Rebouças? Qual a importância de Antônio Pereira Rebouças para a advocacia brasileira? Como Antônio Pereira Rebouças contribuiu para a independência do Brasil? Antônio Pereira Rebouças enfrentou racismo em sua carreira? Qual foi o legado de Antônio Pereira Rebouças?
São três os advogados negros pioneiros. O primeiríssimo, uma mulher, Esperança Garcia, assina o primeiro habeas corpus que se tem notícia, mesmo na condição de escravizada, em 1770 – história resgatada neste século XXI, que lhe valeu o reconhecimento da Ordem dos Advogados do Brasil – seccional Piauí.
Antes de Esperança, Luiz Gama foi reconhecido com pioneiro na prática do Direito, legislando inclusive em causa própria, resgatando sua condição de nascido livre, depois de ter sido vendido como escravo por seu pai, para pagar dívida de jogo.
Entre os dois, Antônio Pereira Rebouças, pai dos irmãos Rebouças nascido baiano, na cidade de Maragogipe, em 10 de agosto de 1798, durante o período de escravidão no Brasil, filho de Gaspar Pereira Rebouças, alfaiate português, e Rita Brasília dos Santos, escravizada liberta.
Contexto
Antônio Pereira Rebouças chega à luz por um ventre livre, dois dias depois da eclosão, em Salvador, da Revolta dos Alfaiates, também conhecida como Conjuração Baiana, da qual seu pai não participou.
Do ponto de vista internacional, na época, fim do século XVIII, o caçula de nove irmãos, quatro homens – entre eles o médico Manuel Maurício Rebouças – e cinco mulheres, cresce em um momento de boom econômico na capitania da Bahia, devido à alta internacional do preço do açúcar, por conta da Revolução do Haiti, liderada por escravizados, entre 1791 e 1804, na então colônia francesa de São Domingos.
Estimativas informam que, ao nascer, a população baiana girava em torno dos 100 mil habitantes, sendo 72%, negros – escravizados, libertos, miscigenados e poucos nascido livres.
Herói da independência
Aos 16 anos de idade, Rebouças muda para Salvador. Ele quer prosseguir seus estudos. Aposta na educação como meio para alcançar estabilidade social e é grande entusiasta da leitura e da escrita.
Em discurso na Sociedade Amante de Instrução, em 1847, ele disse:
“… o mais imperioso dos deveres do homem não pode deixar de ser a instrução daqueles que a seguem na senda da vida: é mesmo para a espécie humana não só uma obrigação moral, como uma condição inerente à sua própria existência”.
Até os 22 anos, Rebouças estudou política e dedicou-se a conhecer leis e jurisprudências. Trabalhou como escrevente no cartório dos tabeliães Francisco Alves da Albergaria e João Carneiro da Silva Rego. E em 1821, obteve permissão para advogar na Bahia, como autodidata.
Logo depois, se enturmou com o grupo de resistência à recolonização do Brasil – para que se instalasse um governo integrado por brasileiros, favoráveis à formação de um Estado Constitucional – e participou de todas as batalhas decisivas. Segundo seus próprios diários biográficos, se considerava um herói da independência.
Racismo e intelectualidade
Impedido de tomar posse do governo das novas vilas que se formavam na Bahia, em 1823, viaja para o Rio de Janeiro, então capital do Império. Mas, antes, quando da passagem de Dom Pedro I pela Bahia, recebe o título de Cavaleiro da Ordem do Cruzeiro pelos serviços prestados durante a Guerra de Independência do Brasil.
Entre 1828 e 1847, elege-se, por sete vezes, deputado – seis vezes pela Bahia e uma vez por Sergipe. E, durante seus mandatos, se opôs a práticas como a pena de morte e participa de debates sobre as reformas da Constituição Imperial.
No ano de 1847, em ato especial do Poder Legislativo, recebe autorização, por notório saber, para advogar em todo país, mesmo sem ter frequentado um curso superior. E em 1866 é nomeado Advogado do Conselho de Estado, função que realiza por mais de vinte anos, participando principalmente de ações de libertação de escravos no Tribunal da Relação no Rio de Janeiro.
Antes, Rebouças ocupa, ainda, o cargo de conselheiro geral da Província da Bahia, em 1828, e recebe o título de Conselheiro do Imperador Dom Pedro II, em 1861. Daí ser lembrado como “Conselheiro Rebouças” e “Rebouças, o velho“, por ser, também, pai de André Rebouças, Antonio Pereira Rebouças Filho e José Rebouças, entre outros cinco filhos.
Questão de cor
Por ser miscigenado, Rebouças se considerava diferente dos outros negros – africanos e criolos (negros nascidos no Brasil) -, mas a branquitude não o via como um igual.
Sua biografia conta que Rebouças foi vítima de racismo em boa parte dos cargos que ocupou, mas evitava fazer qualquer associação entre sua cor e suas posições políticas liberais ou condição social. Ele temia ser visto como um radical por conta da série de revoltas iniciadas por escravos que ocorriam na época, como a Revolta dos Malês, em 1835, na Bahia, e a das Carrancas, em 1833, em Minas Gerais.
Não há provas concretas, mas a família Rebouças tentou, por algumas gerações, apagar suas ligações com a escravidão. Comenta-se que sua mãe, Rita dos Santos, casou com branco para ter oportunidades de ascensão econômica e social e impedir quaisquer tentativas de reescravização.
Os documentos biográficos deixados pela família não fazem menção à ascendência africana dos pioneiros e, com raras exceções, a questão da cor é citada em seus relatos pessoais.
Mas a discriminação, o racismo e o preconceito por causa da cor foram marcas presentes em sua trajetória. Durante sua viagem ao Rio de Janeiro, em 1823, por exemplo, foi quase impedido de seguir caminho. Quando chegou a Porto Seguro, teve de provar sua identidade para continuar.
Segundo a biógrafa Keila Grinberg, “se fosse apenas mulato, sem a fama dos recentes feitos, Rebouças possivelmente nem passaria das fronteiras da província […] Assim, para diferenciar-se dos outros, Rebouças fazia uso dos dois únicos recursos de que dispunha: a profissão e a independência.”
Quando no serviço público, em 1824, toma posse como Secretário do Governo Provincial de Sergipe, enfrenta dura repressão dos proprietários locais, que se incomodavam com a cor da sua pele e o fato de estar à frente de negócios do governo.
E é neste momento que Rebouças torna a luta por direitos civis central em sua trajetória profissional, mas, ainda assim, sem referir-se à questão racial.
Rebouças evitava ao máximo tornar a cor um problema político. Sua estratégia era distinguir-se como cidadão por seus méritos e qualificações e diferenciar-se de qualquer outro pardo que não havia alcançado essa condição.
No final
A partir de 1865, impactado pela morte de sua esposa Carolina Pinto Rebouças, ele se retira da vida pública. Passados cinco anos, fica cego e falece dez anos depois, na Corte.
Rebouças foi autor de vários livros – muitos deles autobiográficos -, entre os quais: Requerimento ao Imperador D. Pedro I, Ao Sr. Chefe de Polícia, Observações à Consolidação das Leis Civis do dr. Augusto Teixeira de Freitas, Recordações da vida patriótica.
Sua biblioteca avaliada em 2:757$500 réis, uma fortuna para época, era composta de uma maioria de exemplares voltados a questões de jurisprudência e história.
Além disso, o advogado possuía as obras completas de autores como Molière, Pierre Corneille, Blaise Pascal, Montesquieu e Mirabeau, mostrando uma predileção pela literatura francesa, de grande influência sobre a elite brasileira de seu tempo.
Antônio foi um dos poucos intelectuais brasileiros a discutir a Revolução do Haiti, muito presente no imaginário do Brasil por ocasião de seu nascimento. Ele usava o vitorioso levante negro para advogar contra a discriminação de cor, embora não se posicionasse contra a escravidão.
Fontes: Geledés – Instituto da Mulher Negra; Wikipédia
Escrito em 22 de abril de 2021
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