Pular para o conteúdo
InícioDa escrita à foto na Lua

Da escrita à foto na Lua

As invenções negras são de todos os tempos, não fazem distinção de gênero, idade, diploma e vão das mais básicas e simples às mais sofisticadas.

Livres ou escravizados, os negros nunca economizaram neurônios. Benjamin Banneker, matemático e astrônomo, é o primeiro inventor afro-americano notável, que se tem notícia. Em 1753, construiu um relógio de madeira que marcava a hora precisa, embora ele só tivesse visto previamente um relógio de sol e um relógio de bolso. Calculou as relações de engrenagem do relógio e as esculpiu com uma faca de bolso, criando o primeiro relógio dos Estados Unidos.

O relógio de sol que mede a passagem do tempo pela observação da posição do sol, instrumento mais antigo conhecido para marcar a passagem do tempo ao longo do dia no mundo  foi criado pelos keméticos (assim eram chamados os antigos egípcios), por volta de 3.500 a.C. 

Quer dizer, em se tratando de hora certa, de ponteiros no lugar, o pioneirismo é negro.

Mas Banneker faz parte também da história da capital americana. Ele trabalhou com Pierre L’Enfant no projeto de Washington, D.C. Só que L’Enfant deixou o projeto e levou todas as plantas. Aí entra o nosso pioneiro, que foi capaz de reproduzi-las de memória.

Nascido em Ellicott’s Mills, Baltimore County, Maryland, filho de um escravizado com uma negra livre, Robert e Mary, entendia, ainda, de literatura, história e matemática em livros emprestados. 

Apropriação

Outro afro-americano chamado Benjamin, nascido na escravidão em 1819 e ‘batizado’ Benjamin Montgomery, inventou uma hélice de barco a vapor projetada para águas rasas – uma invenção valiosa, que facilitou a entrega de alimentos, entre outros produtos. 

A Hélice de barco a vapor, criação do Benjamin Montgomery.
A Hélice de barco a vapor, criação do Benjamin Montgomery (Imagem: Wikisource)

Montgomery tentou patentear o seu invento, mas o pedido foi rejeitado por ele ser escravizado, considerado um ‘não cidadão’ pela branca sociedade dominante. O sistema de patentes, criado oficialmente em 1787 nos Estados Unidos, não estava aberto aos afro-americanos nascidos de escravos.

Essa barreira, entretanto, não impediu nossos ancestrais de seguirem dando asas à imaginação e inventando coisas geniais, mesmo que outros, não negros, assinassem o feito.

De acordo com pesquisa de Shontavia Johnson, advogada e professora de Direito de Propriedade Intelectual da Drake University, os proprietários muitas vezes tomavam crédito por invenções de pessoas negras que tiveram sua liberdade roubada.

Generosidade

E, assim, ocultos, sequestrados, de detalhe em detalhe, negros e negras, na plenitude de suas mentes, se fazem presentes na vida da humanidade das maneiras as mais diversas.

A saudosa e, ainda, utilizada caneta tinteiro tem a assinatura de William Purvis. E entre suas invenções incluem-se melhorias em sacos de papel, no carimbo de mão e um sistema ferroviário elétrico de conduite fechado…

Alice Parker teve a ideia da fornalha de aquecimentoElbert R. Robinson, mais ousado, facilitou a vida das pessoas com um meio de transporte conhecido como bonde elétrico.

Fornalha de aquecimento criação da Alice Parker (Imagem: Reprodução)

Fundamentais

Gênios na terra e no espaço fizeram parte da corrida espacial, lutaram por melhores condições de vida para todos e até salvaram a economia. 

Lloyd Quarteman, por exemplo, é o responsável por colocar para funcionar o primeiro reator nuclear na década de 1930. George Carruthers, astrofísico da NASA, a agência espacial americana, desenvolveu a câmera remota ultravioleta, usada na missão da Apolo 16, que permitiu ao mundo ter uma visão das crateras da lua na década de 1960. 

Câmera Lunar Ultravioleta
Câmera remota ultravioleta de George Carruthers (Imagem: National Air and Space Museum)

George Washington Carver criou métodos de cultivo que salvaram a economia do sul dos Estados Unidos, implantando melhorias no processo de fabricação de pinturas e colorantes, investigando as doenças das plantas e desenvolvendo nada menos que 325 produtos derivados do amendoim. Detalhe: na sua época, amendoim era comida para porcos. E ele é, também, o cara que criou o índigo blue, que deu o tom das calças jeans!

Preto genial!

Elijah McCoy, ferroviário, encarregado de engordurar as máquinas, acabou desenvolvendo dois sistemas para engordurá-las sem que tivessem de parar de funcionar, o que foi fundamental na revolução industrial do século 20. Mas estas foram só duas das mais de 50 patentes no seu nome. 

Na mesma pegada – ‘exagerada’ -, Frederick Jones merece ser lembrado nos dias muito quentes quando temos a possibilidade de ligar o ar condicionado ou escolhemos lotar o freezer com comida congelada. 

Entre suas mais de 60 patentes registradas ao longo da vida, está o sistema de refrigeração montado no teto usado para refrigerar mercadorias em caminhões durante o transporte prolongado em meados da década de 1930. 

Sua empresa, a Thermo Control Company dos EUA, foi muito importante durante a Segunda Guerra Mundial, ajudando a preservar sangue, alimentos e suprimentos para os soldados. E, graças a Jones, também, os produtos congelados ficaram mais acessíveis e são consumidos no mundo todo.

Ao alcance da mão

Outros dois inventores incríveis e muito presentes no nosso século 21 são Richard Spikes e Jesse Russel. O primeiro desenvolveu a caixa de câmbios automáticos para os automóveis em 1932 e, o segundo, o celular digital e a internet banda larga.

Misturando transporte com telefonia, Granville T. Woods que, com seu transmissor do telefone, revolucionou a qualidade e a distância que podia viajar o som. Seu trabalho mais memorável, no entanto, foi a melhora no serviço dos trens ao inventar o sistema de telegrafia ferroviário que, primeiro, permitiu enviar mensagens de trem a trem, e depois, em 1888, melhorado, eletrificou esse sistema de transporte. 

Esboço do Sistema de telegrafia ferroviário de Granville T. Woods
Esboço do Sistema de telegrafia ferroviário de Granville T. Woods (Imagem: Google Patente)

O agradecimento ao registro primeiro de todas essas invasões deve ir àqueles que nos presentearam com a escrita mais antiga do mundo, os egípcios. Com desenhos e símbolos, muito utilizados nos túmulos, templos, paredes de pirâmides, em sarcófagos, pedras e papiros, foram eles que iniciaram o caminho para que nada se perdesse no tempo.

Gostoso escrever: só podia ser preto!

Acompanhe as histórias ao longo do mês.


Fontes: Feira Preta, Geledes-Inventores, BuzzFeed, Geledés, Observatório3Setor, Taquigrafia em foco, Assemb. Leg.

Livros: “Cientistas e Inventores Negros”, Ava Henry e Michael, Williams BIS Publications; “Cientistas e Inventores Negros”, Ava Henry e Michael; “Negros e negras inventores, cientistas e pioneiros”, de Carlos Machado; “História Preta das Coisas”, de Bárbara Carine Soares Pinheiros

Escrito em outubro de 2021

4 comentários em “Da escrita à foto na Lua”

  1. Muito interessante. Gostei muito gostaria de receber mais notificações, acho que isto fortalece os jovens para um estudo mais aprofundado sobre ideias negras, tenho certeza que muito jovens curiosos adoraria pesquisar sobre tudo isto.

    1. Tania Regina Pinto

      Dagoberto, nos acompanhe em @primeirosnegros no twitter ou no Instagram. Você pode também marcar no site pra receber as notim abraço, Tania

  2. Pingback: Na batida do tambor • Primeiros Negros

  3. Pingback: Olodum, Deus dos deuses, na batida da resistência

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *