Perfil escultural, 1,79 m de altura, maçãs do rosto acentuadas, visual andrógeno, olhar marcante, performances atraentes, símbolo de moda, arte, excentricidade, glamour, atriz, multifacetada, lenda da música, pioneira, polêmica, Beverly.
O que este artigo responde: Quem é Grace Jones? Grace Jones é artista? Onde Grace Jones nasceu? Por que Grace Jones é considerada uma pioneira? Quais são alguns dos sucessos de Grace Jones? Grace Jones teve influência na moda? Grace Jones participou de filmes? Qual a orientação sexual de Grace Jones?
Estas as palavras de Beverly Grace Jones em sua biografia, de 400 páginas, I’ll Never Write My Memoirs (Eu nunca escreverei minhas memórias), da Gallery Books, que é muito mais uma autoanálise sobre o processo de formação de uma persona artística.
Não por acaso, na rápida apresentação do que seria o livro escrito em parceria com Paul Morley, está escrito: “Ela jogou ovos em táxis em Paris que não paravam para ela, saiu com Andy Warhol, viveu como nudista por um tempo e é o tipo de mulher que tenta qualquer coisa uma vez”.
E tudo começa com a pequena Bev…
Que nasce na Jamaica, no pequeno condado de Spanish Town, em 19 de maio de 1948, onde mora até os 12 anos, até se mudar para Syracuse, em Nova York. Como de costume no país, a pequena Bev, como era chamada, passou a viver com os seus seis irmãos na casa de sua avó, enquanto seus pais – o pastor pentecostal Robert e a costureira Marjorie – trabalhavam nos Estados Unidos.
A criação rígida incluía idas à igreja pelo menos três vezes por semana, espancamentos crescentes e culpa por “quebrar” a lei de um “deus malicioso” e constantemente enfurecido.
Grace conta que, aos nove anos, foi encontrada dentro de um barril com um garoto. A comunidade levou duas semanas para decidir como a puniria. E “os golpes vieram secos”, relembra. “Era tudo sobre Bíblia e espancamentos”.
“Eu odiava meu pai, ele era tão estrito. Mas, agora, eu o amo, porque eles não o tornaram bispo por muito tempo por minha causa. Teve um artigo sobre mim, com uma fotografia da família ao redor do piano. Meu pai não estava na foto, mas pelo fato de ter sido publicada em uma revista, ele deveria cortar relações comigo, como na Bíblia diz: ‘Se seu braço direito te ofender, você o corta’. Ele disse: ‘Eu não me importo, eu apoio minha filha.’ Mas isso o impediu”, contou ela em entrevista ao The Guardian.
Grace Jones é resultado desses espancamentos “por qualquer pequeno ato de desobediência” e assume que isso a formou: “Minhas escolhas, homens por quem eu fui atraída – tudo o que pode ser rastreado de volta para como eu fui criada”. E mais o fato de ser uma criança tímida, que sofria bullying na escola.
Entre os que incentivaram a sua rebeldia, Christian, um de seus irmãos.
Na primeira pessoa
A vida mudou quando, aos 18 anos, Grace Jones, nos Estados Unidos, decide experimentar tudo que pode: deixa crescer o cabelo black, adere ao nudismo, desbunda no amor livre e no LSD.
Com sede de vida e mundo, posa de coelhinha da Playboy – revista direcionada ao público masculino, que se notabilizou por suas páginas principais estamparem fotos de modelos e celebridades em ensaios nus -, faz pequenas atuações no teatro (ela estudou teatro na Universidade de Syracuse, no estado de NY) e inicia a carreira de modelo, que a leva a Paris, à vida noturna, a conhecer o teatro japonês do kabuki por intermédio do estilista Issey Miyake e o papa da pop art Andy Warhol – de quem se torna musa, sendo fotografada incontáveis vezes.
A partir daí, esculpe uma carreira pioneira como uma das primeiras modelos negras a sair em capas de revistas de moda e campanhas publicitárias para grandes marcas, como Yves Saint Laurent e Kenzo na década de 1970. Torna-se um dos principais nomes quando o assunto é estilo andrógeno, multifacetada eterniza sua imagem como supermodelo, rainha da era disco e atriz.
A cantora
Miss Jones é uma cantora contralto, domina algumas técnicas de soprano e tem duas formas de cantar que predominam em seu trabalho: o canto falado, fraseado como nas canções Corporate Cannibal e Walking In The Rain, e o modo quase soprano como em La Vie En Rose e Slave To The Rhythm – a última, peça fundamental da cena noturna de Nova York na década de 1980.
Além de ser dona de vocais fortes, autoritários e hipnóticos – sua extensão vocal mede 5,4 oitavas, ela toca acordeão e prefere apresentações no estilo underground em seus shows sem grandes divulgações.
No mundo da música, foi indicada ao Grammy pelo seu trabalho que une diversos gêneros, incluindo reggaes e R&B. Mas o principal é que seu nome é referência na remodelagem da música pop.
A maioria das grandes artistas Pop – alfineta – copiam Grace Jones, escreve em seu livro, referindo-se a Beyoncé, Lady Gaga, Madonna…:
“A moda vem e as pessoas dizem ‘siga essa tendência’. Há muito disso no momento. ‘Seja como Sasha Fierce (Beyoncé). Seja como Miley Cyrus. Seja como Rihanna. Seja como Lady Gaga. Seja como Rita Ora e Sia. Seja como Madonna’. Eu não posso ser como elas – exceto pelo fato que elas já estão sendo como eu. Tenho sido tão copiada por essas pessoas que acham que fiz fortunas e acreditam que sou muito rica. Mas fiz as coisas pela empolgação, pelo desafio, pela novidade, não pelo dinheiro. E muitas vezes fui a pioneira, não a beneficiária.”
Produção musical
Assim escreve Beverly Grace Jones em I’ll Never Write My Memoirs , onde narra o processo de transformação da jovem garota jamaicana em avatar do hedonismo luxuoso da era disco music.
Seu estouro como cantora acontece após assinar contrato com a Island Records, em 1977, com hits Disco e Dance. De cara, foram três álbuns: Portfólio, Fame e Muse. O público já enlouquece, apesar do seu pouco envolvimento com as produções, por conta de o seu produtor na época, Tom Moulton, autoritário, castrar seu canto e todo o processo criativo.
A reviravolta acontece quando Grace encontra Chris Blackwell, o dono e fundador da Island Records, também jamaicano. Os dois se tornam amigos e ele a incentiva a seguir o caminho esboçado com a versão de La Vie en Rose – imergir no som e redescobrir a Jamaica.
O resultado foi Warm Leatherette, de 1980, disco que redefine seu som e a consolida como uma das artistas mais provocadoras da época. Ela se adapta à música New Wave e lança também, em 1981, o álbum Nightclubbing, com readaptações de músicas de Sting, Astor Piazzola, The Pretenders, Iggy Pop, Roxy Music e Flash and The Normal e Tom Petty.
O amadurecimento culmina em One Man Show, de 1982 – show e “filme concerto” em que leva ao palco todas as sonoridades, todos os países e todas as referências artísticas que absorveu. Um espetáculo, concebido para destacar as suas qualidades performáticas, hoje estudadas por todas as divas pop:
“Eu era tanto uma artista performática como uma cantora pop ou atriz. Ou pelo menos eu estava interessada em apresentar-me como cantora de uma forma que rompesse com o que rapidamente se tornou um conjunto muito estreito de tradições. A maior parte da performance pop não levava em conta a pop art, os filmes de Warhol, uma passarela europeia ou o teatro japonês. Parecia haver muitas maneiras diferentes de fazer um concerto onde você seria influenciado não por um show de rock’n’roll ou uma dança soul, mas pela arte minimalista, expressionismo e cinema de vanguarda”.
De quebra – só para dar um toque nacional -, Grace Jones marca presença em trilhas sonoras de novelas brasileiras, como Locomotivas, com That’s The Trouble; I Need a Man, em Sem Lenço, Sem Documento; La Vie En Rose, em O Pulo do Gato, e Do Or Die, em Pecado Rasgado.
Seu primeiro álbum após sair da Island Records, Inside Story, de 1986, produziu o hit I’m Not Perfct (But I’m Perfect For You), que entrou na Billboard Hot 100.
O álbum Bulletproof Heart , de1989, atinge o primeiro lugar nas paradas Hot Dance Music/Club Play com o hit Love On Top Of Love.
Muitas de suas canções são consideradas clássicos.
Visual único
O look severo e andrógino de Grace Jones, a partir de sua altura, inclui o corte de cabelo em formato quadrado e roupas acolchoadas. A concepção é do cabeleireiro Christiaan Houtenbos, seu vizinho, e do estilista Jean-Paul Goude, com quem ela teve seu único filho, Paulo, do grupo pop francês La Gouache.
Era meia-noite – conta o hairstylist. Ela berrou seu nome na janela e disse que queria cortar os fios – o jeito foi criar o visual com a gilete que tinha em casa.
As capas icônicas de Nightclubbing e Slave To The Rhythm exemplificam essa nova identidade, que é levada ao seu trabalho de palco rapidamente, em performances de diversas personagens com roupas peculiares e de forte atitude.
Grace influencia o movimento power dressing dos anos 1980 e artistas como Cher, Annie Lennox e Claudie Fritsch-Mentrop.
Seu corte de cabelo em “caixa” dos anos 1970 é seguido por muitos negros da América na década seguinte.
E Grace Jones segue, reconhecida pela força de seu look único e pela sua música:
A atriz
Na arte cênica, sua trajetória é cinematográfica e começa com o papel de Zula, uma amazona, em Conan, o Destruidor, de 1984. Em seguida, ela faz o papel de May Day, em 007: A View To a Kill, de 1985, e a exótica dançarina vampírica Katrina, usando a pintura corporal de Keith Haring, em Vamp, de 1986, sendo indicada como Melhor Atriz Coadjuvante pela Saturn Awards nos três filmes.
Em 1992, é Helen Strange e grava a canção-título do filme, 7 Day Weekend , no filme Boomerang, de Eddie Murph. E, nove anos depois, aparece junto com Tim Curry em Wolf Girl como a travesti e aberração de circo Christoph/Christine.
No começo da carreira no cinema, Grace atuou em filmes de produção baixa, frequentemente com conteúdo sexualmente explícito.
Polêmica
Pode ser o sobrenome de Beverly Grace Jones…
Além da defesa do uso recreativo de drogas, de atuar como gogo-dancer nos anos 1960, de posar nua com o namorado para a revista Playboy em 1987, Grace, em 1981, esbofeteou o apresentador de talk show Russel Harty após ele dar as costas para ela e ignorá-la em uma conversa – fato que ficou em primeiro lugar em uma enquete em 2006 da BBC sobre os momentos mais chocantes do mundo dos talk shows.
E apesar de ser conhecida por suas performances ousadas, acabou banida do Walt Disney World para sempre, em 1998 – convidada a se apresentar no parque, ela mostrou os seios para o público enquanto cantava no palco.
Sobre música e vídeo nestes tempos de hiperconexão, Grace declara:
“Os jovens artistas se expõem de qualquer maneira, sem nenhum tipo de preparação ou orientação. E mesmo os talentosos se perdem em meio a tanta informação. Fica tudo igual, na sarjeta. É muito difícil ser original atualmente”.
Fontes: Portal Terra, Mundo Fotográfico, JC, Harpers Bazar, Wikipédia, Portal Popline
escrito em fevereiro de 2022
Ótima matéria! Grace Jones realmente é épica e atemporal.
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