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Negras que mudaram a história da Ciência

Jaqueline, Mamie, Jeanne, Ruth, Flemmie, Gladys, Alice, Bessie, Jane, Jewel, Marie, Patricia, Gloria, Christine. Elas não são celebridades, influencers, formadoras de opinião, não tem milhões de seguidores, não temem ser canceladas nem se comportam para agradar a gregos e troianos

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Jaqueline, Mamie, Jeanne, Ruth, Flemmie, Gladys, Alice, Bessie, Jane, Jewel, Marie, Patricia, Gloria, Christine… mulheres negras, cientistas – biomédicas, oncologistas, químicas, fisioterapeutas, psiquiatras, psicólogas, nutricionistas… – que mudaram a história da Ciência Médica e da humanidade!

Sem elas, teríamos nossas vidas bem mais curtas e, talvez, registrássemos ainda mais mortes nestes quase dois anos e meio de pandemia de Coronavírus (covi-19) – um vírus que se espalhou pelos quatro cantos do mundo, a partir de dezembro de 2019, e que em janeiro de 2022 já era responsável pela morte de 5 milhões e 63 mil habitantes do planeta Terra e pelo contágio de 363 milhões de pessoa Terra.

Estes são números do Wikipédia, atualizados em ???? Números oficiais que, talvez, não se aproximem nem de longe da realidade, tantas as pessoas que morreram abandonadas nas ruas, nas casas, nas portas dos hospitais, nos países que tiveram menor acesso às vacinas.

O negacionismo de governos, como o do Brasil, que deliberadamente estimulou o povo a se contaminar, não respeitando as medidas de controle da pandemia como uso de máscara e distanciamento social, também contribuíram enormemente para a sabotagem dos números estatísticos que poderiam, ajudar, sobremaneira, a salvar vidas.

Na contramão, pela Ciência, a biomédica e pesquisadora, negra e brasileira, Jaqueline Goes de Jesus, doutora em Patologia Humana e Experimental, coordenou a equipe responsável pelo sequenciamento do genoma do vírus SARS-CoV-2 apenas 48 horas após a confirmação do primeiro caso de COVID-19 no Brasil.

O sequenciamento permitiu diferenciar o vírus que infectou o paciente brasileiro do genoma identificado na cidade de Wuhan, epicentro da pandemia na China. 

Detalhe: a média no resto do mundo para esse mapeamento foi de 15 dias. 

Leia a sua história no artigo de Lizandra Andrade

Questão racial e saúde

A saúde mental da população negra é tema de muitas das nossas pesquisadoras da área médica que vieram primeiro, no início do século XX. 

A psicóloga Mamie Phipps Clark (1917-1983), por exemplo, se destaca com sua pesquisa sobre a autoimagem das crianças negras, essencial para demonstrar o dano causado pelas escolas segregadas dos Estados Unidos, durante o julgamento, pela Suprema Corte, do caso Brown v. Board of Education, em 1954. O veredito tornou inconstitucional a segregação racial nas escolas públicas. 

No “teste da boneca”, Mamie e seu parceiro de pesquisa ofereceram uma boneca negra e uma branca às crianças e, depois, perguntaram como se sentiam em relação a cada uma delas.

Mamie Phipps Clark durante o experimento. (Imagem: Cecil Beaton/Getty Images)
Mamie Phipps Clark durante o experimento. (Imagem: Cecil Beaton/Getty Images)

Devido às suas descobertas — que as crianças preferiam brincar com a boneca branca em vez da boneca negra, demonstrando que a segregação afetava negativamente a autoimagem das crianças negras — as escolas foram finalmente dessegregadas nos Estados Unidos.

A psiquiatra Jeanne Spurlock (1921-1999) também pesquisa o impacto do racismo no desenvolvimento infantil e abordagens terapêuticas para  pessoas não brancas.

Além disso, conscientiza a comunidade médica sobre os efeitos da pobreza, do racismo e do machismo sobre a saúde.

Na mesma linha, o estudo da psicóloga Ruth Winifred Howard (1900-1997), a primeira mulher negra a obter um doutorado em psicologia nos EUA, que tornou-se duas vezes pioneira ao publicar um estudo sobre trigêmeos de idades e etnias diferentes antes dela, as pesquisas analisavam gêmeos e não incluíam a questão racial.

Contemplando a infância, outra pioneira, Flemmie Pansy Kittrell (1904-1980), a primeira mulher negra a obter um doutorado em nutrição nos EUA.

A nutricionista muda o nosso olhar para o desenvolvimento infantil, ao ser uma das primeiras pessoas a chamar a atenção para os efeitos do ambiente doméstico no desenvolvimento infantil

E, na sua jornada ao redor do mundo, para cooperar com cientistas da área da nutrição, chega a prestar consultoria para o governo da Libéria sobre formas de resolver os problemas da desnutrição suas recomendações reformularam completamente o setor agrícola daquele  país. 

A bioquímica Gladys W. Royal (1926-2002) é outra profissional da área médica com foco em projetos de nutrição, só que  no Programa de Serviço de Alimentação do Departamento de Agricultura dos EUA. 

Seu maior feito, entretanto, é a descoberta de maneiras de usar transplantes de medula óssea como tratamento contra o envenenamento por radiação. 

Hanseniáse

Mas nem todas as cientistas negras tiveram seu reconhecimento em vida. Alice Augusta Ball (1892 – 1916), prodígio da ciência e química, responsável pelo primeiro tratamento eficaz contra a hanseníase, é celebrada desde 1970, mais de cinco décadas após a sua morte!

Alice viveu 24 anos, mas um ano antes de morrer, durante seu mestrado de Química na University of Hawai, revolucionou a área médica com seus estudos sobre a composição do óleo de Chaulmoogra e a esterificação de seus ácidos graxos, transformando-o em uma solução solúvel e injetável no organismo. 

Alice Ball (Imagem: National Geographic)
Alice Ball (Imagem: National Geographic)

Após sua morte, o químico Arthur Lyman Dean deu continuidade à sua pesquisa, mas ficou com todos os créditos pelo trabalho. A verdade científica só foi resgatada em 1970 pelas pesquisadoras Kathryn Takara e Stanley Ali.

Antes de Alice, as pessoas sabiam que um tratamento potencial para a doença – chamada de “lepra” – existia no óleo de Chaulmoogra, mas ele era espesso demais e não solúvel em água. 

Alice estudou Química na University of Washington e durante seu curso, obteve também um diploma de bacharel em Química Farmacêutica (1912) e outro em Farmácia (1914). 

A causa de sua morte é desconhecida, mas supõe-se que teria sido um acidente de trabalho em uma aula prática, na qual inalou gás cloro. 

Autonomia

A fisioterapeuta Bessie Blount Griffen (1914-2009) também teve problemas – próprios da época em que mulheres, em especial negras, viviam em permanente combate à tentativa de minar e/ou abafar sua criatividade.

Ao trabalhar com soldados feridos durante a 2ª Guerra Mundial (1939-1945), Bessie cria uma sonda para alimentação para amputados, que lhes garante maior autossuficiência. A The American Veterans Administration (Administração dos Veteranos Americanos), entretanto, não aceita a patente. Por isso, a pesquisadora opta por vendê-la ao governo francês.

Mas ela não para por aí. Publica suas observações sobre as características da escrita à mão e a descoberta de novas formas de detectar documentos falsificados, dando uma guinada total na própria carreira, indo da fisioterapia para a ciência forense.

Câncer e coração

Na oncologia, Jane Cooke Wright (1919-2013), cientista visionário no combate ao câncer, descobre formas menos invasivas de administrar a quimioterapia – em uma época que o tratamento estava em fase experimental – e desenvolve formas de testá-la em células isoladas em vez de em pacientes vivos ou ratos de laboratório.

Na mesma área, a bióloga Jewel Plummer Cobb (1924-2017),  trabalha para identificar os compostos mais efetivos para alterar o crescimento e combater células cancerosas.

Jewel Plummer Cobb em seu escritório na Universidade do Estado da California, em 1988. (Imagem: The New York Times)
Jewel Plummer Cobb em seu escritório na Universidade do Estado da California, em 1988. (Imagem: The New York Times)

Nos seus experimentos, cultiva tecidos de tumores humanos fora do corpo – em vez de em pessoas vivas – para descobrir novos tratamentos contra a doença. E, ainda, ajuda a formar o National Science Foundation’s Committee on Women and Minorities in Science (Comitê da Fundação Nacional de Ciência sobre Mulheres e Minorias na Ciência, nos EUA).

Marie M. Daly (1921-2003), a primeira mulher negra a obter um doutorado em química nos EUA,  também assina uma pesquisa sobre câncer e genética. Seu trabalho vital, porém, se refere à compreensão dos ataques cardíacos, a partir de sua pesquisa sobre a ligação entre colesterol alto e artérias entupidas.  

Visão

A doutora em oftalmologia Patrícia Era Bath (1942-2019) é a primeira mulher e negra do Instituto de Olhos Jules Stein, primeira mulher e negra a liderar um programa de pós-graduação em oftalmologia e primeira mulher e negra eleita para o quadro honorário do Centro Médico da Universidade de Los Angeles, nos EUA.

E tem registradas cinco patentes científicas, quatro delas relacionadas ao tratamento da catarata doença caracterizada pela perda de transparência do cristalino, lente natural cuja função é propiciar o foco da visão em diferentes distâncias. Todas as suas descobertas são utilizadas internacionalmente, incluindo a sonda Laserphaco, que realiza cirurgia à laser nos olhos.

Patricia Era Bath (Imagem: Reprodução)
Patrícia Era Bath (Imagem: Reprodução)

Patrícia Bath é, ainda, cofundadora do American Institute for the Prevention of Blindness (Instituto Americano pela Prevenção da Cegueira), organização sem fins lucrativos que ajuda a tratar casos de cegueira que podem ser evitados.

Na área da visão, outro destaque é para a psicóloga experimental Gloria Twine Chisum (1930), cuja pesquisa levou aos óculos de proteção para pilotos que escurecem automaticamente. 

A importância de seu feito reside no fato de pilotos serem suscetíveis à perda de consciência durante curvas fechadas. No caso de uma explosão nuclear, clarões podem cegá-los facilmente. Os óculos de Gloria Chisum reduzem alguns desses riscos.

Além da Terra

Em sua jornada, pesquisadoras negras da área médica vão além do planeta Terra e buscam soluções para duas das grandes preocupações dos astronautas quando estão no espaço – a vertigem e o estrondo sônico.

A psicóloga  Patricia Suzanne Cowings (1948) tem em seu currículo o desenvolvimento de treinamentos para astronautas da Nasa, a agência espacial americana, a fim de amenizar os efeitos da vertigem e a exploração de formas de estender essas técnicas a doenças psicossomáticas e outros problemas de saúde.

Trabalhando para a mesma agência, a matemática e engenheira aeroespacial Christine Concile Mann Darden (1942) ocupa a liderança do grupo de estudos sobre estrondo sônico, desenvolvendo programas que simulavam esses estrondos e métodos para prevê-los e minimizá-los. 

Christine Darden (Imagem: Wikisource)
Christine Darden (Imagem: Wikisource)

Christine também foi essencial para encontrar formas de diminuir os efeitos mais negativos do estrondo sônico, como a poluição sonora e a depleção do ozônio (redução na concentração de Ozônio estratosférico que permite que mais UV-B alcance a superfície da Terra).

Registre-se, ainda, que é a primeira mulher afro-americana no Centro de Pesquisa Langley promovida a Senior Executive Service, o cargo mais elevado do serviço público federal nos Estados Unidos.

Mas estas são apenas algumas das muitas cientistas negras e este artigo traz só um pouquinho do muito do que elas têm feito pela humanidade inteira!


Fontes: livro Black Women Scientists In The United States (Mulheres Negras Cientistas nos Estados Unidos, em tradução livre), de Wini Warren; Buzzfeed, Unicentro, Wikipédia-Patricia, Wikipedia-Gloria, Saúde-Abril, Wikipedia-Christine

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