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O museu da diáspora africana
Museu Afro Brasil, um espaço de resgate do auto amor para o povo negro, espelho a refletir nossas potencialidades, espaço pedagógico para a ressignificar a história, reeducar o povo e combater o racismo.
O que este artigo responde:
O que é o Museu Afro Brasil? Qual é a história do Museu Afro Brasil? Qual é a missão do Museu Afro Brasil? Desde quando existe o Museu Afro Brasil? Qual é a importância do Museu Afro Brasil? Qual é e quantas obras fazem parte do acervo do Museu Afro Brasil? Onde fica o Museu Afro Brasil? De quem é o Museu Afro Brasil? Qual é o tamanho do Museu Afro Brasil? O que é a pedagogia do conflito no Museu Afro Brasil?
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O maior museu da diáspora africana, o Museu Afro Brasil Emanoel Araujo, fica em São Paulo, a maior cidade da América Latina, centro financeiro do Brasil, onde vivem cerca de cinco milhões de pessoas negras. Em seus 11 mil metros quadrados, a partir de mais de oito mil obras, é possível entrar em contato não só com os mais de cinco séculos de história do Brasil, mas com nosso viver africano. E tudo sob o ponto de vista negro. Neste espaço, o protagonismo é do povo de origem africana no mundo.
A ideia original para a sua criação, aliás, surge da cabeça de um homem negro, o escultor baiano Emanoel Araujo – que não só empresta seu nome ao museu, como doa as primeiras 1.100 obras de seu acervo e é o diretor curador por quase 20 anos.
No Plano Museológico, o próprio Emanoel conta a essência da sua ideia:
“É um museu da autoestima, do orgulho, espelho para crianças, jovens, adultos e idosos finalmente se verem representados neste Brasil, para refletir uma sociedade disposta a incorporar o outro nas suas diferenças… Um instrumento para se repensar novos conceitos de inclusão social…”
E, de fato, ao ser criado em 2004, o Museu Afro Brasil assume como missão desconstruir estereótipos, imagens deturpadas e expressões ambíguas sobre pessoas e fatos relativos ao povo negro.
Nossa história tem de ser contada desde antes da escravização. Só assim é possível contemplar todas as nossas contribuições, legados, participações, revoltas, gritos e sussurros que tiveram lugar no Brasil e no circuito das sociedades afro-atlânticas.
Leia mais a respeito em Museu Afro Brasil, um conceito em perspectiva.
O passado
A história do Brasil, na versão do colonizador e seus herdeiros, alimenta desde sempre o imaginário da população negra, associado à escravização, literalmente, roubando a nossa cor ao exaltar a história de sucesso de pessoas de origem africana sem grilhões.
A cor dos negros Machado de Assis e Castro Alves, celebrados na literatura, e do gênio barroco Aleijadinho – só para citar alguns exemplos – não é contemplada ao se falar da formação cultural e social do país.
Não é por acaso que Emanoel Araujo escreve:
“Não se pode dizer que a vigorosa contribuição do negro à formação de uma cultura legitimamente brasileira não tenha interessado aos nossos estudiosos. Essas pesquisas, todavia, têm praticamente se limitado à escravidão propriamente dita e à herança negra encontrada no sincretismo, na música, no idioma, na literatura e nos costumes. As artes plásticas sempre foram relegadas a plano secundário, limitando-se praticamente a trabalhos isolados e incompletos”.
Por tudo isso, a necessidade de uma contra narrativa:
“O Museu Afro Brasil mostra a competência e a dignidade da população africana e afrodescendente neste país. É o encontro da positividade, da resistência, encontro cidadão…”
A jornada
A trajetória e as influências africanas na construção da sociedade é contemplada em diversos aspectos, sem perder de vista, entretanto, a sociedade racista em que vivemos.
Espaços do museu são ocupados com a exposição de objetos de tortura, bem como imagens que retratam o controle da violência contra corpos negros e as condições da travessia forçada do Atlântico. Mas a ideia principal é valorizar o protagonismo do povo negro em áreas do conhecimento as mais variadas.

Nesse sentido, o Museu Afro Brasil se reconhece, também, como um espaço educativo e de contestação da história oficial, que desconstroi o imaginário de subalternidade do povo negro.
Pedagogia do conflito
A escola é um microcosmo que reproduz o ambiente em que vivemos na sociedade e não são poucas as pesquisas que apontam os “espaços de educação” como os mais violentos, quando o assunto é preconceito e discriminação racial.
E o crime – racismo é crime previsto em lei – se manifesta entre todos que compõem a população escolar, por meio de xingamentos e ofensas, tratamento desigual, violência física, negação de oportunidades, desrespeito à religiosidade, exclusão, isolamento, constrangimento, desqualificação da aparência, negação da história, questionamento da competência…

Na contramão de tais práticas, o Museu Afro Brasil aposta em visitas em grupo, mediadas com intencionalidade, por seus corredores e salões, a partir das obras em exposição.
E não falta público: cerca de 40 mil estudantes, de escolas públicas e privadas, vão ao museu todos os anos.
Inevitavelmente, acontece, conflito entre os conteúdos apresentados em sala de aula e o olhar proposto pelo museu. Afinal, são mais de 500 anos de construção de uma história pautada pela exclusão, presente nos livros didáticos, que alimenta desigualdades criadas e cristalizadas no Brasil.
Mas, contra fatos, não há argumentos e é aí que a pedagogia do conflito acontece, como explica Rafael Domingos, do núcleo educativo:
“O Museu Afro Brasil é embasado e subsidiado em um acervo composto por mais de 8 mil obras. Sempre que situações de racismo acontecem, não se intervém nelas de forma discursiva. O grupo é levado até uma obra onde isso está posto, e a discussão acontece a partir da materialidade.”
Além disso, o Museu Afro Brasil mantém um programa educativo para formação de professores e o cumprimento da Lei 10.639, que estabelece a obrigatoriedade de ensino da história e cultura afro-brasileira, mas a partir de um outro ponto de vista.
Rafael cita como exemplo a abordagem sobre o tema da escravização, que acontece a partir de uma discussão sobre as tecnologias e o trabalho:
“É uma visão mais complexificada e que olha para o sujeito que foi escravizado como um sujeito que construiu de fato o Brasil a partir da sua força de trabalho”.
Uma árvore de saber
O trabalho, aliás, é um dos principais troncos da árvore de saber que é o Museu Afro Brasil, ao lado de ancestralidade e espiritualidade. No Plano Museológico a proposta é explícita:
“Criar um museu que registre, preserve e argumente a partir do olhar e da experiência do negro, a formação da identidade brasileira”.
A presença de pessoas de origem africana nas Américas é indissociável da experiência de desenraizamento de milhões de seres humanos. É a escravidão que, na diáspora, força o contato e o intercâmbio entre membros de diferentes nações africanas e produz as mais diversas formas de assimilação entre suas culturas e as dos escravocratas, bem como de resistência à dominação .
Os galhos
O museu está divido em seis núcleos: África: Diversidade e Permanência, Trabalho e Escravidão, Religiões Afro-Brasileiras, O Sagrado e o Profano, História e Memória e Artes Plásticas: a Mão Afro Brasileira.
África: Diversidade e Permanência é dedicado à riqueza cultural, histórica e artística dos povos africanos. Exibe obras das mais variadas funcionalidades e concepções estéticas, que demonstram a competência técnica dos seus autores e exemplificam a imensa diversidade do continente. Nas vitrines, encontram-se de máscaras e estatuetas, feitas em madeira, bronze e marfim, a vestimentas bordadas em fios de ouro, originárias de diferentes países e grupos culturais.
O núcleo Trabalho e Escravidão destaca os saberes e tecnologias trazidos da África para o Brasil. Confirma a ideia de que o conhecimento dos africanos é determinante para o desenvolvimento dos ciclos econômicos. Pinturas, gravuras e esculturas retratam parte dessas contribuições, bem como documentos e outros objetos ligados ao mundo do trabalho, tais como máquinas de moer cana e ferramentas de carpinteiros e ferreiros.

A parte consagrada à Espiritualidade – Religiões Afro-Brasileiras – compõe-se de visões de mundo e mitologias, por meio de pinturas, gravuras, esculturas, instalações e fotografias, com destaque para o panteão de orixás, suas vestimentas e instrumentos musicais.
Instrumentos musicais de origem africana e vestimentas também se fazem presentes no núcleo O Sagrado e o Profano, que apresenta espaços de sociabilidade dos africanos escravizados nas festas brasileiras – como Congada e Maracatu -, bem como símbolos relacionados a antigos reinos da África, como máscaras e bandeiras.
O espaço dedicado à História e Memória se volta a personalidades negras que se destacaram em diversas áreas do conhecimento. Fotografias e documentos exaltam a trajetória de escritores como Carolina Maria de Jesus, autora do livro Quarto de Despejo; dos engenheiros da família Rebouças, além de outros notáveis como o geógrafo Theodoro Sampaio.
Em Artes Plásticas: a Mão Afro Brasileira, uma viagem por diferentes períodos da arte no Brasil – o Barroco e o Rococó, a Arte Acadêmica, a Arte Popular, Moderna e Contemporânea. Entre os artistas de origem africana nascidos no Brasil, destaque para Estevão Roberto da Silva, Rosana Paulino, Rubem Valentim e Mestre Didi.
O pioneiro
Emanoel Araujo, criador do Museu Afro Brasil nasce em Santo Amaro da Purificação, na Bahia, em 15 de novembro de 1940 em uma tradicional família de ourives. Aprende marcenaria, linotipia e estuda composição gráfica. Depois, em Salvador, na década de 1960, ingressa na Escola de Belas Artes, da Universidade Federal da Bahia, e estuda gravura.
Sua primeira premiação nacional acontece em 1966, na II Exposição Jovem Gravura Nacional no Museu de Arte Contemporânea de São Paulo e, no circuito internacional, data de 1972, quando conquista a medalha de ouro na 3ª Bienal Gráfica de Florença, Itália.
Dirige o Museu de Arte da Bahia, de 1981 a 1983, e a Pinacoteca do Estado de São Paulo, entre 1992 e 2002. Leciona artes gráficas e escultura no Arts College, na The City University of New York, em 1988.
Ao longo da carreira, expõe em várias galerias e mostras nacionais e internacionais, somando cerca de 50 exposições individuais e mais de 150 coletivas. Sua maior obra, entretanto, sua “utopia realizada”, sem dúvida, é o Museu Afro Brasil:
“Um museu que está na maior cidade brasileira e numa das maiores do mundo, a qual, por ser ela própria multicultural e multirracial, é o palco ideal para concretizar essa utopia, assumindo uma tarefa pioneira na criação de uma instituição que pode servir como instrumento para se repensar novos conceitos de inclusão social”.
– Emanoel Araujo
Museu Afro Brasil Emanoel Araujo, Secretaria da Cultura, Economia e Indústria Criativas do Estado de São Paulo, administrado pela Associação Museu Afro Brasil – Organização Social de Cultura.
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Endereço: Pq. Ibirapuera, Pavilhão Padre Manoel da Nóbrega, São Paulo, capital
Funcionamento: de terça-feira a domingo, das 10 às 17 horas
* Visitas guiadas só com agendamento
@museuafrobrasil
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Fontes: Museu Afro Brasil, Parque Ibirapuera, Educação e Território, G1
Escrito em 1 de abril de 2025
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