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Chocolat, o primeiro negro a fazer sucesso na França

Olá! Interessado em conhecer mais sobre o Palhaço Chocolat? Ele é uma figura emblemática na história da cultura afro-brasileira, deixando um legado marcante no mundo do circo. Vamos mergulhar um pouco mais na vida e obra desse personagem fascinante!

Antes de personalidades negras nos fazerem rir no cinema, existiu Rafael Padilla, o primeiro artista a fazer sucesso na França como o palhaço Chocolat, um ator cômico que não se vestia de palha, apesar de ser esta a origem da palavra que conta da sua profissão.

Chocolat
Foto original: Du Guy/Domínio público via Wikimedia Commons

Rafael Padilla nasce em Cuba entre  1865 e 1869 – ninguém sabe ao certo. Possivelmente escravizado. Seu nascimento não foi registrado. Apesar do tráfico negreiro ter sido proibido em 1880, Cuba é o penúltimo país da América a abolir a escravatura em 1886.  

Algumas fontes indicam que Rafael é de um 17 de setembro, em qualquer ano antes de 1870, pois a partir desse ano a corte espanhola emancipou todos os escravizados nascidos, em uma espécie de “lei do ventre livre”.

A princípio ‘Padilla’ não é o nome da família de seus senhores ou de seus pais, mas apenas um dos vários nomes que adotou durante a vida. Rafael não possuía nenhuma memória de seus pais biológicos, a não ser o fato de que eles o abandonaram para fugir de uma plantação onde eram escravizados.

Abolição para quem?

Criado por uma mulher negra nas favelas de Havana, ainda menino é vendido a um empresário espanhol chamado Patrício Castaño Capetillo e levado para a  cidade de Su Puerta, no norte da Espanha.

A abolição em vigor na Europa, entretanto, não impede que a família Castaño o trate como escravizado. Rafael era o único negro no povoado onde vivia. E era maltratado por todos. Dormia nos estábulos com os animais.

Por volta dos 15 anos, Rafael foge e vai trabalhar nas pedreiras na região do Basco do Sul. Pouco tempo depois, se muda para Bilbau, onde trabalha como estivador e carregador na estação ferroviária.

Reforçando estereótipos 

Em Bilbau, Rafael conhece Tony Grice, um palhaço viajante, inglês, que o contrata como ajudante e criado. Grice, diversas vezes, se ‘inspira’ em  Rafael para satirizar pessoas negras, lançando mão do blackface, o que é inaceitável nos dias atuais. 

O blackface – pintar a pele de preto –  é uma prática que tem pelo menos 200 anos. Acredita-se que tenha-se iniciado por volta de 1830 em Nova York, onde pessoas negras eram ridicularizadas para o entretenimento de brancos, a partir de estereótipos e piadas, principalmente nos Estados Unidos e na Europa. 

Descontente e infeliz, Rafael abandona Tony Grice por diversas vezes, porém não consegue outros empregos e retorna para ser criado do palhaço que, precisando de novidades para o palco e consciente da força e das habilidades de seu empregado, decide colocá-lo como seu assistente e dublê em alguns números.

Os dois formam um novo duo e alcançam notoriedade  quando se apresentam com o “Novo Circo” de Joseph Oller em Paris, em outubro de 1886. 

O nome artístico de Rafael, “Chocolat”, é dado a ele nessa época por Tony. E, como Chocolat, ele frequentemente interpreta um selvagem que arranca sustos e risos das crianças. O duo sobrevive por dois anos.

Carreira solo

Chocolat é um ator cômico, bom na dança e na mímica e se transforma em atração solo em uma pantomima – um gênero da arte mímica em que o ator, silencioso, com o rosto pintado de branco, luvas, executa ilusões no espaço, normalmente com caráter cômico, contando uma história. 

O Casamento de Chocolat
Litografia colorida: espetáculo em 1888 ministrado pelo palhaço Chocolat no Novo Circo [“Nouveau Cirque”]. (Ilustração: Alfred Choubrac)

O espetáculo se chama “O casamento de Chocolat”, é um grande sucesso e fica cinco anos em cartaz no Novo Circo.

Durante esse período, também, Rafael encontra o amor de sua vida, Marie Hecquet, uma mulher casada, com dois filhos, que se divorcia para ficar com ele.

Tapas cômicos?!

Em 1895, o diretor do Novo Circo propõe um novo duo para Rafael, o juntando com o inglês George Foottit, que viria a se tornar seu parceiro de longa data.

Juntos, Foottit & Chocolat criaram a base de um dos esquetes mais famosos do mundo da comédia: os “tapas cômicos” –  Foottit, o sério e inteligente, bate sem dó em Chocolat, o bobo amigável e dócil.

Até hoje essa fórmula é replicada em espetáculos circenses e na televisão.

Footit & Chocolat eram sucesso absoluto. Encantaram multidões no final do século XIX. Um novo e ótimo contrato para uma residência em Paris viria a ser o auge de sua carreira. Muitas pessoas nunca haviam visto um negro. As crianças passavam o dedo em Chocolat e se surpreendiam por não soltar tinta.

Foottit & Chocolat
Foottit & Chocolat em sua clássica esquete “The Stationmaster”
(Ilustração: Henry Gerbault/Domínio público via Wikimedia Commons)

Chocolat tinha consciência do racismo, combatia os estereótipos, mesmo apanhando durante os espetáculos. Fazia questão de mostrar seu talento e habilidades circenses para o público. Fora do picadeiro, andava com os melhores ternos e jóias para ostentar o seu poder econômico, mas se envolveu com drogas e jogos de azar.

O despertar atrás das grades

Rafael vivia em um mundo único. Era um ator de sucesso, tinha muito dinheiro, mas não tinha documentos e sua pele era preta – características que causavam estranheza na sociedade e na polícia. 

A falta de uma carteira de identidade, de uma certidão de nascimento, de uma carta de alforria, de um papel legal que atestasse a sua liberdade de existir o levou para atrás das grades. Na prisão, ele conhece um ativista que influencia o seu olhar sobre si mesmo. Livre, Rafael passa a exigir salário igual ao de seu parceiro, a querer ser retratado nos cartazes de divulgação dos espetáculos com suas feições e não como um animal. Para a branquitude da época, entretanto, era demais.

Morte em vida 

Em 1905, o Novo Circo não renova seu contrato e a dupla passa a se apresentar no Folies Bergère, uma casa de música parisiense do tipo cabaré. 

É o início do século XX e logo eles são substituídos por grupos de negros norte-americanos que apresentavam o Cakewalk, uma dança tipicamente negra norte-americana que satirizava a dança dos brancos senhores de escravos. 

A dança era uma novidade na Europa e, mesmo satirizando a branquitude, fazia sucesso.

A dupla retorna para o “Novo Circo” em 1909, mas sem a fama de antes. 

No ano seguinte,  a separação definitiva da dupla é anunciada nos palcos. Foottit é convidado pelo diretor Andre Antoine para interpretar um palhaço em Romeo e Julieta no Teatro Odeon em Paris e conta para a plateia:

“Vou interpretar Romeu no Odeon!”

Chocolat rebate:

E daí? Estou interpretando Otelo no Comédie-Française!” 

O primeiro Otelo sem blackface

Chocolat abandona o picadeiro, quer ser ator de teatro e estreia com a peça Otelo

Pela primeira vez na França, o protagonista  negro da peça de Shakespeare é interpretado por um ator negro. Mas o personagem não agrada o público. E Chocolat não se adapta à carreira solo e desenvolve a doença do alcoolismo.  

Assim termina a vida do  primeiro ator negro a fazer sucesso na França. 

Rafael Chocolat morre em 4 de novembro de 1917, na cidade de Bordéus, na França.

Apesar do sucesso, do pioneirismo e da inspiração, fica esquecido por décadas, como se nunca tivesse existido. Só recentemente seu, em Bordéus, foi reconhecido e identificado.

Quase um século depois de sua morte, sua história é revisitada com o filme Chocolat, de 2016. O palhaço negro é interpretado pelo ator Osmar Sy, que propõe uma reflexão sobre o legado do ator:

“Nascer escravo, fugir e se tornar um artista é um percurso inacreditável. Imagina a dose de coragem e trabalho que ele precisou ter para chegar lá. Será que o fato de ter superado essas etapas todas da vida e chegar onde chegou não é por si algo forte? Achei igualmente interessante a história de sua chegada ao sucesso e sua queda. Chocolat fazia rir através dos estereótipos que havia sobre os negros (…)  Será que podia fazer outra coisa para além de se mover com este estandarte preto? Ele é preto. Há nele uma forma militante e livre de viver a sua época sem se questionar. Vive a sua vida. É um artista e, apesar de tudo, é uma sátira da sociedade…

Conheça também a história de Benjamin, o primeiro palhaço negro brasileiro.

Fontes:

Espaço Filme; Circopedia; Remezcla; Wikipedia.

Explorando o Legado de Palhaço Chocolat: Uma Jornada na Cultura Afro-Brasileira

Nesta página, você encontrará informações sobre Palhaço Chocolat, uma figura icônica na história da cultura afro-brasileira. Seu papel no mundo do circo e suas contribuições para a arte são amplamente reconhecidos. Vamos descobrir mais sobre esse personagem e seu legado duradouro.

Quem é Palhaço Chocolat? Palhaço Chocolat é uma figura emblemática na história da cultura afro-brasileira e do circo.

Qual é o legado de Palhaço Chocolat? Ele deixou uma marca significativa na arte circense e na representação afro-brasileira.

Por que Palhaço Chocolat é considerado uma figura icônica? Devido ao seu papel pioneiro e suas contribuições para a cultura afro-brasileira.

O que você pode esperar encontrar nesta página sobre Palhaço Chocolat? Informações sobre sua vida, carreira e impacto na cultura circense e afro-brasileira.

Qual é o objetivo principal da página sobre Palhaço Chocolat no site Primeiros Negros? Destacar a importância e o legado de Palhaço Chocolat na história cultural do Brasil.

4 comentários em “Chocolat, o primeiro negro a fazer sucesso na França”

  1. Osmar sy vai interpretar ” chocolate” no filme chocolate 16.. olha a importância da divulgação de histórias de mitos de cada país ..as pessoas acendem e mostram interesse em assistir a filmes e documentários..

  2. Obrigado pelo material completo e muito bem feito, sou negro, palhaço, poeta, ator e comecei a me dedicar a pequia sobre essa história, comecei por seu artigo, muito bom.

  3. Pingback: Europa Negra

  4. Allan Brian Botelho

    Parabéns, Estevão!
    Assisti ao filme e depois fui buscar algumas referências históricas, tendo chegado a aqui também. Excelente conteúdo. Uma análise muito patente e que necessita de amplitude na divulgação, pois são incisivos e atuais todos os pontos apresentados. Filme bem reflexivo. Valeu!!

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