A classe de juristas do Tribunal Superior Eleitoral está de cara e raça novas, com a primeira do Tribunal Superior Eleitoral desde agosto de 2023.
O que este artigo responde: Quem é Edilene lôbo? Qual é o pioneirismo de Edilene Lôbo? Qual é a origem de Edilene Lôbo? Qual é a importância da posse de Edilene Lôbo no TSE? Como Edilene Lôbo chegou ao TSE? Qual mensagem Edilene Lôbo passa para as futuras gerações?
Edilene Lobo (Antonio Augusto/Secom/TSE)
Agosto de 2023 – A Suprema Corte dá posse à jurista, advogada e acadêmica Edilene Lôbo no cargo de ministra substituta e ela se torna a primeira mulher negra a fazer parte do seleto grupo de magistrados da Justiça Eleitoral do Brasil!
“Eu gostaria de dizer para aquela menina pobre lá de Taiobeiras (onde nasceu) e para tantas outras Edilenes por este Brasil, que sonham com oportunidades, que chegar a este momento, com esta missão, era algo impensável. Vejo a importância de estar aqui porque nós vivemos de referências… A fotografia da sociedade brasileira e a do Judiciário brasileiro precisam contar com a diversidade, até para que as meninas, as Edilenes, as Cidas, as Marias de qualquer cidade deste vasto país, possam ver que nós cabemos neste espaço.”
Durante a cerimônia de posse, o presidente do TSE, ministro Alexandre de Moraes, exaltou “a competência, a dedicação e o preparo” de Edilene Lôbo. Salientou, ainda, o fato de ela ter conquistado a vaga por mérito, construindo um currículo invejável.
Edilene Lobo, ao lado do ministro Alexandre de Moraes, durante posse no TSE, sendo aplaudida pelo vice-presidente Geraldo Alckmin, pela segunda-dama Lu Alckmin e pelos ministros Benedito Gonçalves, Carmen Lúcia, entre outros. (Antonio Augusto/Secom/TSE)
No final deste artigo, detalhes do currículo da ministra, destacado pelo ministro do TSE.
Renda e escolaridade
Agora, vale uma parada histórica…
O processo eleitoral no Brasilnunca foi explicitamente racista.
Nestes mais de 200 anos de Independência, os quesitos que impediram o povo negro de ir às urnas foram basicamente renda e escolaridade.
Na primeira eleição nacional para a Assembleia Legislativa, em 1824, participaram somente homens com 25 anos (ou 21 anos, se casados), com renda anual mínima de 100 mil réis para votar e de 200 mil réis para serem votados. Já em 1930, mulheres com renda foram admitidas como eleitoras. Dez anos depois, os alfabetizados e só em 1986 os analfabetos.
Ilustração da Casa de Câmara e Cadeia, mais conhecida como Cadeia Velha, construída na primeira metade do século XVII, no antigo Largo do Carmo, hoje Praça XV. O local sediou a Assembleia Constituinte de 1823 e, posteriormente, a Câmara dos Deputados até 1914. (Notices of Brazil in 1828 and 1829/Agência Câmara de Notícias)
Ao mesmo tempo, as leis que sempre “dialogaram” com o racismo, proibiam a presença dos negros nas escolas, no mercado de trabalho formal e, por consequência, a possibilidade de comprovação de renda para viver neste país como cidadão. Cidadania que, na prática, até hoje é negada a nós como povo.
Quando em 1940 se dá direito ao voto aos alfabetizados, apenas 25% dos negros sabiam ler e escrever. O percentual mais que dobra em 1980, alcançando a marca de 57%. Mas a população preta inteira só teve direito ao voto mesmo em 1986.
O curioso é que em nenhum momento houve a proibição explícita de colocarmos o voto na urna por questão racial!
Então, se considerarmos que há apenas 37 anos – em 91 anos de Justiça Eleitoral e 201 anos de processo eleitoral -, conquistamos o direito ao voto, ter a primeira mulher negra na corte eleitoralé uma vitória e tanto e que conta o tamanho da racismo e a potência da nossa luta desde a escravização.
A cor da vergonha é branca
Nasce uma pioneira. Edilene Lôbo é a décima sétima filha de uma família pobre, de 20 filhos! Ela vem à luz na pequena Taiobeiras, cidade do norte de Minas Gerais. Seu pai, viúvo com sete filhos, casa-se com sua mãe e tem outros 13 filhos. Ela tem 19 irmãos!!!
Na adolescência, muda, junto com a família, para Betim, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, em busca de mais oportunidades de trabalho e estudo. Cinco dias antes de completar 14 anos, a futura ministra ingressa no mercado de trabalho, com carteira assinada. Função? Empacotadora de supermercado.
Segue seus estudos em escola pública, conhece mulheres maravilhosas, desperta para a política estudantil e sindical e percebe a importância de compreender o mundo do direito.
“O direito se apresentou em minha vida, como um prolongamento de meu olhar para o lugar de onde eu vim, onde estão as pessoas que mais precisam de acesso aos direitos fundamentais.”
No TSE
A pioneira assume a vaga antes ocupada por um homem branco, o ministro André Ramos Tavares. Seu trabalho, como ministra substituta, é participar do julgamento de ações e recursos nas ausências e impedimentos de ministros titulares e analisar ações sobre irregularidades em campanhas durante períodos eleitorais, entre outras atribuições.
Estar neste lugar é o início de uma longa estrada de promoção da equidade e representatividade em tribunais supremos e constitucionais para o povo preto. Seu mandato é de dois anos, podendo haver uma recondução.
O poder é real?
O Brasil está abaixo da média global na nomeação de mulheres para cargos em cortes supremas. A afirmação consta do estudo da Universidade de Oxford “Quem estamos empoderando? – Indicadores e Tendências sobre Diversidade Judicial em Cortes Constitucionais”, apresentado pela Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), de 2022:
A taxa brasileira é de 11,1% de nomeação de mulheres no Supremo, entre 2000 e 2021. A taxa global é 26%.
Na maioria dos 51 países analisados, há prevalência da população branca nas Cortes constitucionais, mesmo que o perfil demográfico da população seja diverso, e a transformação na composição das Cortes tem-se dado nos últimos 21 anos, com o intuito de contribuir com o mapeamento da diversidade de gênero, etnia, idade, formação profissional, cultural e socioeconômica.
Conheça o currículo da ministra
– Doutora em Direito Processual Civil pela Pontifícia Universidade Católica, a PUC-Minas; – Mestra em Direito Administrativo pela Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG; – Especialista em Processo Penal pela Universidad Castilla La Mancha, na Espanha; – Professora do Programa de Mestrado e Doutorado em Proteção dos Direitos Fundamentais da Universidade de Itaúna, de Minas Gerais; – Professora de Processo Eleitoral na Pós Graduação da PUC-Minas; – Professora convidada da Universidade Sorbonne-Nouvelle – Paris, lecionando no Mestrado II sobre Democracia, direitos políticos, eleições e milícias digitais na América Latina.
Como pesquisadora, ela tem em seu currículo estudos sobre inclusão, direitos humanos, sexualidade, entre outros temas. Participa de projetos de pesquisa nacional e internacional e integra a Rede Internacional de Pesquisa Estado e Constituição.
É palestrante em temas voltados à ampliação e proteção dos espaços de participação política da mulher negra e outros grupos de minoria social, assim como sobre o impacto da revolução tecnológica na democracia. E, ainda, é membro da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político, da Comissão de Liberdade de Expressão da Ordem dos Advogados do Brasil, OAB-MG, membro-fundadora do Observatório Mundo em Rede Cyber Leviathan, autora de livros e artigos jurídicos.
Advogada do Partido dos Trabalhadores, em 2018, contribuiu com a campanha da ex-presidente Dilma Rousseff (PT) ao Senado e, desde as últimas eleições, atuava como advogada da Federação Brasil da Esperança, composta pelo PT, PCdoB e PV.
Leia também os artigos Justiça, uma mulher preta, sobre a ausência da mulher negra como sinônimo de poder e justiça no Brasil, e Ministra Negra já!, com a mobilização dos movimentos negros para que ser indique uma mulher negra, a primeira, para Supremo Tribunal Federal.
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