Pular para o conteúdo
InícioPioneirismo NegroEscolinha Maria Felipa, educação infantil afro-brasileira

Escolinha Maria Felipa, educação infantil afro-brasileira

Imagine um lugar onde a educação vai além dos livros tradicionais, um espaço onde crianças aprendem sobre a riqueza das culturas africanas e afro-brasileiras desde cedo. Bem-vindo à Escolinha Maria Felipa, um projeto pioneiro idealizado por Bárbara Carine Soares Pinheiro, que transforma a maneira como vemos e ensinamos história, cultura e ciência. Aqui, a educação é uma janela para mundos muitas vezes esquecidos ou marginalizados, promovendo uma verdadeira inclusão e valorização da diversidade.

Projeto educativo pioneiro e o pensar de sua idealizadora, a professora, doutora em Ensino de Química e consultora pedagógica Barbara Carine Soares Pinheiro.

Escola Maria Felipa (Imagem: Informe Bahiano)
Escolinha Maria Felipa, em Salvador (BA) (Imagem: Informe Bahiano)

Imagine estudar em uma escola onde as turmas são identificadas como Reinos ou Impérios Africanos… 

Imagine conhecer a verdade sobre a primeira escrita, aprender matemática africana, fazer maquetes de pirâmides, ouvir histórias sobre orixás e deuses indígenas…

Imagine aprender com letramento bilingue – metade da aula em português, metade em inglês – e, ainda, em libras – a linguagem dos sinais, em um ambiente voltado à socialização igualitária dos saberes, lutando contra toda forma de opressão, desvalorização e discriminação.

Imagine uma escola diferente, que eduque para a inclusão, para a riqueza que é a  diversidade, uma educação libertadora e com estrutura de educação remota. 

Imagine aprender em família o que as nossas escolas não oferecem, ainda, em termos de conhecimentos para além do continente europeu.

Pois tudo isso faz parte dos objetivos, da prática e da missão da Escolinha Maria Felipa, a primeira escola de educação infantil afro-brasileira, com sede física em Salvador, capital da Bahia, mas que oferece aulas on line e gravadas para crianças de 3 a 6 anos.

Para entender o projeto da Escolinha Maria Felipa são quatro as palavras-chaves:

Afrocentrada

Voltada à socialização de ensinamentos acerca da África e suas múltiplas culturas, com foco nas suas relações, entendimentos sobre o humano, sobre a natureza e suas interconexões, produções científico-tecnológicas, artísticas e filosóficas, seus reinos, impérios e beleza.

Afro-brasileira

Com abordagem educacional a partir de elementos da cultura africana manifesta na diáspora no Brasil, visando socializar e valorizar conhecimentos africanos trazidos ou criados no país, tais como: acarajé, capoeira, mitologia dos orixás, samba reggae…, mas sem folclore ou estereótipos. 

Decolonial

Aponta para o o resgate de outras narrativas que visibilizem processos de produção de conhecimento muitas vezes apropriados e/ou  apagados da história que se conta na escola. O Brasil colônia é presente na nossa noção de beleza, estética, civilização, intelectualidade, religião socialmente aceita, progresso científico e tecnológico, a ponto de a Europa ser colocada como marco civilizatório humano. A teoria Decolonial amplia e ressignifica o nosso olhar.

Antirracista

Proposta que prevê a reversão do sistema de opressões, denunciando o racismo nos diversos segmentos sociais, resgatando o poder negro para a infância e a juventude, a partir da história, da potência da mente, da diversidade fenotípica e do ser social.

Uma intelectual diferentona

Bárbara Carine Soares Pinheiro, idealizadora da Escola Afro-brasileira Maria Felipa, é “uma intelectual diferentona” – este, aliás, é o nome do seu canal no YouTube – e, na versão entrevista, é com ela que celebramos nosso primeiro ano como arquivo digital e o lançamento do selo Primeiros Negros Educação.

Química Bárbara Carine Soares Pinheiro, professora da Universidade Federal da Bahia (UFBA) (Imagem: IMPA)
Química Bárbara Carine Soares Pinheiro, professora da Universidade Federal da Bahia (UFBA) (Imagem: IMPA)

Além de ter ‘parido’ a Maria Felipa, Bárbara Carine é mãe, mulher negra cis, nordestina, escritora, empresária, formada em Química pela Universidade Federal da Bahia (UFBa), mestre e doutora em Ensino de Química e graduanda em Filosofia.

Atualmente, é professora adjunta e vice-diretora do Instituto de Química da UFBa e membro permanente do corpo docente do programa de pós-graduação em Ensino, Filosofia e História das Ciências, além de líder do grupo de pesquisa Diversidade e Criticidade nas Ciências Naturais.

Influenciadora digital, se faz presente também no Instagram – @descolonizando_saberes – e, agora, nas nossas páginas. 

Nossa conversa com esta pioneira acontece no início de agosto de 2021 e esta informação é importante porque Maria Felipa abriu suas portas pela primeira vez no início de 2019. Quer dizer, metade da vida da escola tem a marca da pandemia de Covid-19 e todas as suas consequências…


PN Entrevista

Mecanismos de resistência

Primeiros Negros – Como a Escolinha Maria Felipa conseguiu sobreviver à pandemia? 

Bárbara – No início foi desesperador. A gente é uma escola, uma instituição privada com uma finalidade ideológica muito marcante, com uma implicação social, um projeto histórico, mas uma empresa que paga contas, impostos, folha de funcionários, que paga transporte, alimentação… Não sobrevivemos de donativos, não somos  uma organização não governamental. Então, a dimensão financeira pesou. 

PN – Qual era a fonte de recursos da escola?

Bárbara – Mensalidades e um mínimo de doações por conta de nossa campanha Adote um Educande, em que as pessoas podem doar,  a partir de R$ 5,00 por mês, e  contribuir com bolsas de estudo para crianças negras e indígenas em situação de vulnerabilidade social. 

PN – Como você encontrou saídas?

Bárbara – Lançando mão dos mecanismos de resistência, de sobrevivência,  das nossas mais velhas. Minha mãe foi empregada doméstica. Me criou na periferia de Salvador e quando ela deixa de ser empregada doméstica, passa a sobreviver de outros modos: faz rifa, vende gelatina, cerveja, refrigerante, doce, quentinha… Eu entregava quentinhas no bairro, nas escolas… Então foi o que me ocorreu naquele momento, o legado da mamãe, de sobrevivência. 

PN – Explique…

Bárbara – Meio que isso aconteceu, só que de outro modo. A gente é escola e tem muita gente querendo nos ouvir. Então, começamos a dar cursos on line, cobrando um valor simbólico, buscando atingir o máximo de pessoas.  Batemos na porta das empresas e oferecemos consultoria antirracista – porque depois da morte de George Floyd aconteceu uma onda antirracista no mundo…. Essa sabedoria ancestral, de ser estrategista, fez a gente criar uma lojinha, que vende caneca, camisetas, bijuterias e a gente entrega em qualquer lugar do Brasil… Fizemos rifa do nosso kit pedagógico (links úteis), desenvolvemos um material pedagógico com mais de 100 páginas e vendemos a preço simbólico… Intensificamos a vaquinha on line e conseguimos praticamente dobrar as doações mensais. 

Acesse: Links Úteis da Maria Felipa e saiba mais

PN – Quais os impactos? O que mudou do projeto original?

Bárbara – Mais que um sonho local, a Escola Maria Felipa é um projeto coletivo, um projeto educativo pioneiro no Brasil e as pessoas se sentem corresponsáveis. Então, nos reorganizamos. 

Derrubada das divisas

PN – Com quantos alunos a escola abriu as portas?

Bárbara – Quando começamos em 2019, tínhamos 10 crianças e, no final do ano, chegamos a 36 crianças, das quais oito bolsistas. Em 2020, no início, estávamos com 44 crianças, sendo 10 bolsistas, veio a pandemia, e terminamos o ano com 29 crianças on line, inclusive de outros estados. Agora, estamos com 36 crianças, só tivemos um cancelamento.

PN – Vocês conseguiram manter a maioria dos alunos…

Bárbara – A gente perdeu muitas crianças…  Mesmo assim, houve famílias que pagaram o ano todo por conta do compromisso político com a escola. Mas impactou, principalmente as famílias negras. E a gente negociava o tempo todo, sem imposição. Perguntava: ‘Quanto você pode pagar?’ e aceitava o possível para a pessoa.

Crianças em atividade com professora na Escola Maria Felipa (Imagem: Divulgação)
Atividade externa na Escolinha Maria Felipa (Imagem: Divulgação)

PN – Aulas on line faziam parte do projeto original?

Bárbara – Não. Ninguém sabia o que era on line, o que era uma pandemia, quanto tempo ia durar… Foi tudo novo.

PN – E a clientela? Mudou? 

Bárbara – As famílias que matricularam são atípicas. Não sei se presencialmente essas famílias matriculariam seus filhos na escola, principalmente por conta da distância. Geralmente, atendemos crianças da região, à exceção das bolsistas. Muita gente diz que é apaixonada pelo projeto, mas mora longe – a escola é no Rio Vermelho. E temos crianças de outros estados – São Paulo, Sergipe, Rio Grande do Norte e Rio Grande do Sul – e mesmo após a retomada das atividades presenciais, quando todas as professoras estiverem vacinadas com as duas doses, manteremos o sistema híbrido, presencial e à distância.

Vertical x horizontal

PN – Vocês conseguiram manter todo o quadro de funcionários?

Bárbara – No começo, tínhamos duas psicólogas, duas coordenadoras, estagiários e conseguimos manter todo mundo até o final de 2020, inclusive os profissionais que não conseguiram se adaptar às aulas à distância, mas sinalizando, desde antes, que a gente não conseguiria manter isso em 2021, porque não sabíamos o que ia acontecer…

PN – Qual a visão da relação empregatícia da Maria Felipa?

Bárbara: Ficamos com uma psicóloga, uma coordenadora, mas mantivemos todos os professores, por compreender que é uma questão de um segurar a mão do outro, o quanto a gente pode. Porque também não adianta segurar a mão e afundar todo mundo junto. A gente tem que ter uma inteligência emocional, financeira. Eu sou uma pessoa muito de escuta das mais velhas, minha mãe, meu babalorixá, de sentir, de me deixar conduzir. 

PN – Você é a única dona da escola?

Bárbara – Tenho 50% da escola. Minha sócia, a Maju –  Maria Juliana Passos – tem 40%. Somos nós quem tocamos a escola hoje. Maju também é uma mulher negra. E temos, ainda, 10% de um investidor. No começo, era eu e o pai da minha filha… A gente separou. Ele vendeu a parte dele… 

PN – Qual o desafio de ser a primeira escola afro-brasileira, mesmo estando em Salvador, a mais negra das cidades brasileiras?

Bárbara – Desafio de se mostrar sem negociar sua existência, mas com inteligência. A escola por exemplo, hoje, tem metade dos alunos de famílias brancas. Acho que a gente conseguiu construir esse lugar do discurso. O discurso de alinhamento entre as próprias pessoas pretas. 

PN – Quando se pensa em uma escola afro-brasileira não é ‘automático’ se imaginar que é uma escola só para pretos?

Bárbara – Mesmo como pessoas pretas, somos diversos. Tem a pessoa que é pan- africanista, a outra que é mulherista africana, a outra do movimento negro e  achava que a escola tinha que ser afrocêntrica, decolonial… Dentro da militância negra existem diferentes perspectivas, então a gente busca se construir curricularmente no sentido de manter a nossa essência.

PN – E qual é esta essência?

Educar nossas crianças para ressignificar a sua ancestralidade a partir de um passado potente, afro-indígena. Ou seja, sair do eurocentrismo com positivação subjetiva. As crianças se construírem com um retrovisor que não é quebrado, como o retrovisor da história que nos é apresentada até hoje. Esse é o foco. E fazemos isso de muitos modos. Ao mesmo tempo, não se mostrar radical, avesso às pessoas brancas. Nosso intuito é educar as pessoas brancas, racializá-las também. Nosso intuito não é só atrair pessoas brancas porque elas também mantêm financeiramente o projeto. Queremos ter pessoas brancas aliadas. É possível ter pessoas brancas aliadas apesar de suas limitações de seu campo existencial, de entendimento de uma série de coisas… Encontrar esse lugar foi algo muito difícil, mas estamos conseguindo.

Linha do tempo do continente africano, construída em atividade na Escolinha Maria Felipa (Imagem: divulgação)
Linha do tempo do continente africano, construída em atividade na Escolinha Maria Felipa (Imagem: divulgação)

PN – Como vender essa ideia, a princípio, ‘conflitante’?

Bárbara – Se falamos em escola afrocentrada, as famílias brancas não vão vir aqui. Mesmo as brancas empáticas, de esquerda, vão achar que é escola para preto. Então, na campanha de matrícula para 2022, optamos pela nomenclatura AfroEducativa, que traz a dimensão do afro, que é o nosso carro chefe, mas traz a dimensão da afetividade. Não estamos raivosos e raivosas.

PN – Quanto ao registro da Escola Maria Felipa como ‘escola de educação infantil afro-brasileira’, algum estranhamento dos poderes públicos?

Bárbara – Tivemos muita dificuldade para registrar a escola por mais que eu explicasse que a escola seguia a Base Nacional Comum Curricular, que não estávamos negligenciando a lei, achavam que por ser escola afro-brasileira era tipo escola do olodum, do ilê… Eu conversava e explicava: não tem escola canadense, panamericana, francesa… a gente é uma escola afro-brasileira. Mas não havia nenhum registro de escola afro-brasileira em uma secretaria de educação. Era tudo muito novo para eles.  Foi difícil… difícil no financeiro… difícil no relacional… Difícil construir um lugar hierárquico saudável entre pessoas negras.

PN – Maria Felipa é um negócio de mulher preta, dirigido por mulher preta…

Bárbara – É e as pessoas não estão habituadas a serem chefiadas por mulheres negras de trinta e poucos anos. As pessoas esperam ser lideradas por homens brancos, senhores… Como construir esse lugar de diálogo, de troca… A gente começou sem hierarquia nenhuma e  percebeu que não dava. Acabei  sobrecarregada, sendo a referência de resolução de todos os problemas. Então percebi que não adiantava construir uma coisa sem hierarquia, porque a hierarquia está posta e eu estava adoecendo… 

PN – Hierarquizar as relações resolveu tudo?

Bárbara – Não. Temos coordenação, direção, para estabelecer prazos, dar ordens, mas precisamos construir o espaço do diálogo. Não se resolve problemas demitindo pessoas – não é este o lugar que a escola se coloca. Como lidar com o profissional que, aparentemente, está insatisfeita porque não gostaria de estar dando aula on line, por exemplo, e não descartá-lo do modo que qualquer escola branca descartaria. Como construir isso? O desafio permanece.

Educação doméstica

PN – A Maria Felipa educa para a inclusão. Mas como reeducar, ressignificar a história junto aos pais, às famílias dos alunos?

Bárbara – O que se aprende na escola chega em casa. Lembro o relato de uma família branca em que a mãe se dizia negra porque sua avó era negra. No nosso primeiro ano letivo, estudamos ancestralidade, identidade e comunidade. Discutimos a constituição fenotípica, além de outros elementos culturais. Aí, a menina de três anos, quando a mãe se disse negra para ela,  retrucou: ‘não mãe, você não é negra’. Quer dizer, a criança não se via como negra, não via a mãe como negra e não tinha nenhum problema nisso. E ela só queria dizer pra mãe que as pessoas são diferentes e que a mãe não podia se colocar nesse lugar. E a mãe foi conversar comigo a respeito e comentou que a filha explicou que, no Brasil, não é a gota de sangue que importa, é a nossa estampa. Quer dizer, tem uma dimensão da extensão da escola para casa. 

PN – A escola discute racismo com as crianças?

Bárbara – O foco não é debater o racismo. Aqui a gente simplesmente fala de poder. Que a Humanidade começa em África, que os primeiros impérios foram africanos, que a ciência é africana, que a matemática surgiu na África, que a primeira forma de escrita do mundo, os hieroglifos, são signos africanos… 

PN – Mas voltando à ‘educação dos pais’…

Bárbara – Estávamos programando um ciclo de debates na escola com as famílias. Mas veio a pandemia e não conseguimos tocar esse projeto. De outro lado, a pandemia levou à educação familiar porque, no on line, a família está ‘dentro da escola’, acompanhando o aluno. No retorno presencial, entretanto, queremos manter um clube de leitura, auto acolhida para mulheres negras, principalmente no sentido de elas criarem uma rede de apoio, profissional.

PN – A intolerância religiosa  é uma marca da nossa sociedade. Como a Maria Felipa lida com essa questão?

Bárbara – Tínhamos dois caminhos: ou assumir que a escola é laica e abolir todas as datas religiosas do calendário escolar ou compreender que estamos dentro de uma cultura conectada com o sagrado. A gente mora em Salvador. Não tem como esquecer do Senhor do Bonfim, de Iemanjá… Então optamos por  tratar tudo como mitologia. Não assumimos a fé do outro numa condição de verdade. Cada um mobiliza os seus sentimentos, a sua relação espiritual,  a partir das suas crenças. Buscamos trabalhar os diferentes marcos civilizatórios – festas espirituais indígenas, festas juninas católicas, feijoada de Ogum, fogueira de Xango…

Aula na escolinha Maria Felipa, em Salvador (BA) (Imagem: Reprodução RFI)
Aula na escolinha Maria Felipa, em Salvador (BA) (Imagem: Reprodução RFI)

PN – Educação decolonial na escola x Tv eurocêntrica. Qual mediação pode ser feita? Como lidar com informações e imagens às vezes até contraditórias?

Bárbara – Tem a alegoria da curvatura da vara. Se a vara está para um lado, a gente entorta ela completamente para o outro. Por exemplo: Dia do Trabalho, fazemos o mural da escola só com de pessoas negras e indígenas, médicos, médicas, jornalistas, professores, juristas… Dia da Mulher, a gente só apresenta mulheres negras e indígenas em espaços de poder. Isso inclusive já gerou debate entre nós. Perguntaram por que não colocar uma profissional de serviços gerais? Penso que podemos fazer essa femenagem  (leia-se: homenagem às mulheres) às profissionais da escola, mas como referência a gente quer mirar no alto. A estética da escola é outdoor de criança preta, referências literárias africanas, indígenas e afrodiaspóricas. Nossa estratégia é o muito.

PN – É possível investir em uma educação doméstica afrocentrada na sociedade em que vivemos?

Bárbara – Propomos atividades de aprender aquilo que o Ministério da Educação orienta, mas a partir da potência africana. Temos um kit pedagógico dividido em blocos de linguagem, matemática, ciências com atividades que as pessoas podem desenvolver com seus filhos e filhas em casa. Se uma criança estuda em uma escola que não elabora questões afrocentradas, é necessário um segundo percurso dentro de casa, com fazeres de aritmética e geometria (link as primeiras invenções africanas), por exemplo, pensadas em África. 

PN – Como uma criança forjada em uma educação afrocentrada vai integrar-se à educação eurocêntrica quando chegar ao ensino fundamental? 

Bárbara – Eu fiz graduação, mestrado e doutorado em Química. Estou no último semestre de Filosofia e nunca tive uma professora negra na minha vida. E me recordo  que, em determinado momento, com 19 anos, perguntei à professora por que a gente não estudava a história da química do Egito – me incomodava só Grécia, Grécia… E a professora respondeu que é porque da África não existiam coisas escritas… Essas crianças daqui não vão acreditar nisso, como eu acreditei, que era tudo cultura oral… As crianças daqui da escola sabem disso, que a a primeira escrita é africana. 

PN – O caminho é desconstruir ‘verdades’?

Bárbara – Temos um projeto chamado ‘Desconstruindo Mitos – Intelectualidade Negra e Indígena’ e já trouxemos cinco escritoras negras para lançar seus livros infantis. Não tem como essa criança ir para outra escola e assimilar que o Brasil foi descoberto porque ela aprendeu outra coisa aqui… Não tem como ela ir para escola e assimilar com naturalidade que pessoas pretas não escrevem, porque desde os dois anos de idade ela vê escritoras negras. É desse outro lugar que a gente trabalha, de construir referências reais, sabendo que o mundo é outro, que a escola é uma bolha, mas uma bolha que não é criada para proteger a criança. Eu criei a escola para a minha filha, uma menina preta. Não foi uma escola pensada ‘ah, minha filha preta vai viver nesse reduto’. Foi para preparar minha filha para o mundo, saber como o mundo é. É nesse sentido que a gente acredita que as crianças daqui saiam diferentes.

Até a 5ª série

Um ano depois de registrarmos o pioneirismo da Escolinha Maria Felipa, a intelectual diferentona Bárbara Carine posta a grande novidade no Instagram: em 2023, irá expandir do grupo II até o 5° ano do Fundamental, mudar para uma nova sede e crescer como um grande quilombo, com educação afrorreferenciada e potente para todes!

Há 4 anos, a Escola afro-brasileira Maria Felipa vem sendo referência em educação antirracista, crítica e decolonial no nosso país, formando crianças, familiares, educadores e educadoras (internos e externos à comunidade escolar), pessoas diversas que nos acompanham nas nossas redes, AfroEducativas, vivências pedagógicas ancestrais, dentre muitos outros momentos de partilha desse grande quilombo educacional brasileiro.

Quem quiser ajudar este projeto a seguir grande pode comparecer aos eventos da reforma, seja realizando o #pixdareforma (CHAVE: escolinhamariafelipa@gmail.com), seja compartilhando a informação. Ubuntu 🖤

O link da campanha no Instagram é: https://www.instagram.com/p/ChRxrnlFRqi/

Saiba mais no nosso Links Úteis Maria Felipa e interaja com nossa escola pioneira.

Atualizado em setembro de 2022


“Quem tem Maria Felipa não precisa de mulher maravilha” – avisa a Escolinha Maria Felipa em sua camiseta – vendida na lojinha – em homenagem, quer dizer ‘femenagem’, a esta mulher negra, referência histórica de força, luta, resistência e liderança, descendente de africanos escravizados do Sudão. 

Marisqueira, pescadora e trabalhadora braçal, Maria Felipa é heroína na luta pela independência do Brasil na Bahia. Liderou um grupo de 200 pessoas – mulheres negras, indígenas tupinambás e tapuias – nas batalhas contra os portugueses que atacavam a ilha de Itaparica, onde nasceu, em 1822. 

Sua liderança não é contada nos livros didáticos, ainda.


“Ninguém nasce odiando outra pessoa pela cor da sua pele, por sua origem ou ainda por sua religião. Para odiar, as pessoas precisam aprender e se podem aprender a odiar, elas podem ser ensinadas a amar.”
Nelson Mandela

Escolinha Maria Felipa: Revolucionando a Educação Infantil com Raízes Afro-Brasileiras

A Escolinha Maria Felipa, localizada em Salvador, Bahia, é a primeira instituição de educação infantil afro-brasileira do país. Idealizada por Bárbara Carine Soares Pinheiro, doutora em Ensino de Química, a escola se destaca por seu currículo inovador que inclui o ensino de matemática africana, histórias sobre orixás e deuses indígenas, além de aulas em português, inglês e libras. Com uma abordagem educacional afrocentrada, afro-brasileira, decolonial e antirracista, a Escolinha Maria Felipa visa combater todas as formas de opressão e discriminação, promovendo uma educação inclusiva e libertadora.

O que é a Escolinha Maria Felipa? É a primeira escola de educação infantil afro-brasileira, localizada em Salvador, Bahia, que oferece um currículo inovador focado na valorização das culturas africana e afro-brasileira.

Quem idealizou a Escolinha Maria Felipa? Bárbara Carine Soares Pinheiro, doutora em Ensino de Química e consultora pedagógica, é a idealizadora do projeto.

Quais são os pilares educacionais da Escolinha Maria Felipa? A escola baseia-se em quatro pilares: afrocentrado, afro-brasileiro, decolonial e antirracista, visando uma educação que valoriza a diversidade e combate a discriminação.

Como a Escolinha Maria Felipa lida com a educação durante a pandemia de Covid-19? Sobreviveu à pandemia adaptando-se rapidamente ao ensino remoto, oferecendo aulas online e gravadas, além de iniciar iniciativas como cursos online e consultoria antirracista para manter sua sustentabilidade financeira.

Qual é a importância da Escolinha Maria Felipa para a comunidade? A escola representa um marco na educação infantil brasileira, promovendo uma aprendizagem inclusiva e decolonial que prepara as crianças para respeitar e valorizar a diversidade cultural e racial desde cedo, além de ser um modelo de resistência e inovação pedagógica.

9 comentários em “Escolinha Maria Felipa, educação infantil afro-brasileira”

  1. Pingback: Links Úteis: Natal na cor • Primeiros Negros

  2. Brava! Projeto que bate cm meus ideais de resgate cultural e afirmação da nossa ancestralidade. Devemos sim, enriquecer e redirecionar a compreensão do nosso povo, cuidando e protegendo nossos irmãos.
    Como posso contribuir com o projeto?
    Qual a faixa etária das crianças acolhidas pelo projeto? Quais séries são admitidas e ensinadas na escola? Obrigado.

    1. Ivonildo, fazendo um copia-e-cola de e-mail que recebi da Maria Felipa – Ano que vem iremos expandir do grupo II até o 5° ano do Fundamental, mudar para uma nova sede e crescer como um grande quilombo. E, tudo isso, requer a comunhão de todes para que consigamos avançar com o nosso sonho coletivo: uma educação afrorreferenciada e potente para todes!

      A Escola afro-brasileira Maria Felipa há 4 anos vem sendo referência em educação antirracista, crítica e decolonial no nosso país, formando crianças, familiares, educadores e educadoras (internos e externos à nossa comunidade escolar), pessoas diversas que nos acompanham nas nossas redes, AfroEducativas, vivências pedagógicas ancestrais, dentre muitos outros momentos de partilha desse grande quilombo educacional brasileiro.

      Hoje estamos avançando e queremos caminhar com você. Podemos contar contigo? Seja comparecendo aos eventos da reforma, seja realizando o #pixdareforma (CHAVE: escolinhamariafelipa@gmail.com), seja salvando e compartilhando esse post, marcando aqui pessoas que admiram o nosso projeto e se interessam em colaborar… não importa como, queremos seguir lado a lado. Ubuntu 🖤

    2. Olá. Vi hoje a existência desta luz, desta esperança, deste lugar de existência plena e viva que se chama Escola Maria Felipa. Meu coração está pulsando amor por cada pessoa envolvida nesse lugar. Sou arte educadora professora de arte e há tempos meu coração não sentia tanto encanto por uma proppsta e escola! Agradeço omensamente. Moro em Itu, SP. Lugar afro brasileiro disfarçado de europeu. Trabalho todp dia com o propósito da beleza e da verdade ancoradas em TODAS as possibilidades ancestrais que temos como herança nessa cidade de mais de 400 anos. Obrigada Escola Maria Felipa💖

    3. Adorei! Quero conhecer. Um caminho de encantos, contos, lutas, sonhos acalentados nos tambores!
      Parabéns!
      Que cresça até o ensino médio! Com arte, dança, trabalhos manuais, música e tudo mais que torne o indivíduo livre, criativo, fraterno e amoroso.

  3. Que coisa boa esse tipo de educação diferenciada e necessária. Nunca entendi, por que as escolas dirás tradicionais não colocaram a história africana, tão importante em nosso país para ser trabalhada na educação infantil. Parabéns pelo trabalho.

  4. Bonjour,
    Parabéns pelo projeto. Uma amiga na Alemanha, sabendo que estou a procura de projetos educativos ajudar, me falou desta escola maravilhosa !

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *